O advogado Cristiano Maronna, doutor em Direito Penal pela USP e diretor da plataforma Justa, avalia que, ao dizer que traficantes são vítimas de usuários de drogas, o presidente Lula associar traz ecos de um discurso ultrapassado sobre o tema. Segundo o criminalista, embora Lula tenha reconhecido o equívoco ao publicar uma retificação, a frase “reflete uma ideia difundida de forma equivocada, que tenta responsabilizar o usuário pela violência ligada ao tráfico”.
“Essa é uma frase simplista e errada, porque o que cria violência não é o fato de existirem pessoas que usam drogas, e sim a opção política pela proibição de certas substâncias”, afirmou Maronna, que é autor do livro “Lei de Drogas Interpretada na Perspectiva da Liberdade”. Ele lembrou que o uso de drogas acompanha a humanidade há pelo menos 12 mil anos e que a relação entre substâncias psicoativas e pessoas “sempre foi pacífica”. “O que introduziu o elemento de violência nessa relação foi a opção política pela guerra às drogas, que tem pouco mais de um século”, disse.
Para o especialista, o contexto internacional também ajuda a compreender a fala do presidente. “O que o Lula quis dizer é que o tráfico de drogas só é tão poderoso como é porque existem usuários. E hoje os Estados Unidos são o país que tem o maior número de consumidores de drogas do mundo, em especial a cocaína”, explicou.
Maronna destacou ainda que a fala de Lula surgiu em um momento em que o ex-presidente Donald Trump usa “o poderio militar americano para atacar o que chama de grupos criminosos, sob o argumento de defender os interesses dos Estados Unidos”. Segundo ele, “cada país deveria buscar tratar os seus próprios problemas, e não usar o combate às drogas como justificativa para intervenções externas”.
