No meio das incertezas sobre o tarifaço de Donald Trump, o governo Lula avalia que o movimento de bastidores coordenado com empresários brasileiros e americanos tem sido um reforço importante nas tentativas de abrir caminho para negociações oficiais, embora não tenha indicações concretas de que será possível impedir a entrada em vigor da taxação. Com apoio dos parceiros nos Estados Unidos que dependem de produtos do Brasil, os executivos usam como argumento o prejuízo que os consumidores americanos terão com o aumento de preços que acompanhará a taxação de 50% sobre os produtos vendidos pelo Brasil.
O vice-presidente Geraldo Alckmin, também ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, e sua equipe ainda buscam mapear as moedas de troca de interesse do presidente Donald Trump. Ao mesmo tempo, o ministro Mauro Vieira (Relações Exteriores) tenta construir uma ponte para aproximação oficial do presidente Lula com a Casa Branca. Enquanto busca saídas, o petista tem em mãos um pacote de medidas que podem ser acionadas com o objetivo de minimizar os prejuízos para a economia brasileira.
A sinalização do secretário americano de Comércio, Howard Lutnick, de que produtos que se encaixam na categoria de “recursos naturais” não cultivados no país – como café, manga, abacaxi e cacau – podem ter tarifas zeradas foi avaliada como positiva pelo Itamaraty. Embora o representante dos Estados Unidos não tenha citado especificamente o Brasil, e de não haver garantia de que esses itens ficarão livres do tarifaço previsto para entrar em vigor na próxima sexta-feira, 1º, a declaração foi entendida como uma brecha que pode ser aproveitada pelo Brasil.
A alta da inflação é um ponto de preocupação da gestão Trump, e o Brasil é, por exemplo, o maior exportador mundial de café, um produto altamente consumido nos Estados Unidos. A taxação do produto elevaria o preço para o mercado local. Por isso, o governo Lula insiste na mesa de negociações.
A equipe econômica entende que, para avançar em qualquer conversa, será preciso oferecer algo. Nessa frente, Alckmin e sua equipe não só já têm em mãos dados para rebater as acusações do governo dos Estados Unidos de práticas comerciais desleais do Brasil citadas na carta em que Trump anunciou o tarifaço, como tentam identificar as áreas de maior interesse para investimentos. Do etanol às big techs, tudo está sob avaliação.
O caso da Embraer
O ministro Fernando Haddad (Fazenda), em entrevista à CNN Brasil, disse que, além de tentar entender exatamente qual é a preocupação econômica do governo de Donald Trump com o Pix, outros assuntos estão sendo tratados pela equipe de Alckmin. A Embraer, por exemplo, tem a maior parte da sua produção voltada para o mercado americano e destaca nas conversas os projetos de mais de US$ 1 bilhão que implementa nos Estados Unidos.
Durante divulgação de resultado na última semana, executivos da companhia americana Skywest ressaltaram que têm encomenda de 74 aviões da fabricante brasileira até 2032 e indicaram que não será possível pagar tarifa de 50% sobre essas compras. Por isso, buscam uma saída com a Embraer.
O governo brasileiro sabe que a área de inovação tecnológica é de interesse da gestão Trump. O tema entrou nas negociações com outros países, como o Japão. Nesse rumo, Alckmin voltou se reuniu nesta terça-feira, 29, com representantes das big techs americanas, como Meta e Google. Foi o segundo encontro do vice com o setor depois do anúncio do tarifaço – houve, inclusive, participação de um representante da Secretaria de Comércio dos Estados Unidos, o que foi entendido pelo governo brasileiro como um sinal positivo.
Todo o esforço do governo e do setor privado é para atuar no entorno do presidente americano, na expectativa de conseguir influenciá-lo de alguma forma. “Em Washington, hoje, só quem pode destravar a negociação é uma pessoa: o presidente Trump”, afirma um diplomata.
O chanceler Mauro Vieira atua na tentativa de preparar o terreno para uma conversa entre Lula e Trump em algum momento. Na avaliação do Itamaraty, não pode ser algo improvisado e não há como avançar nesse sentido sem ter certeza de que o presidente americano “quer conversar sobre tarifas”. Caso contrário, afirmam diplomatas, seria um risco expor Lula às já conhecidas armadilhas do atual ocupante da Casa Branca. “Quem improvisou ao lidar com ele, se deu mal”, argumentam.