A estratégia do governo brasileiro para lidar com as crescentes ameaças do presidente Donald Trump tenta separar a crise atual em duas frentes para conseguir: i) isolar as questões comerciais no nível técnico e ii) descolar o debate político, que deve ser tratado com apoio da base aliada. O vice-presidente e ministro Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria e Comércio) e o ministro Mauro Vieira (Relações Exteriores) estarão à frente das negociações comerciais com apoio das demais pastas, enquanto o próprio presidente Lula, a cúpula do Congresso e os ministros palacianos focarão nas questões políticas, consideradas “inegociáveis”.

O anúncio da viagem de um grupo de parlamentares aos Estados Unidos é uma tentativa de começar a desarmar as bombas acionadas pela família Bolsonaro para constranger o governo brasileiro e pressionar o Judiciário diante do risco de condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro pela tentativa de golpe após perder as eleições de 2022.

Integrantes do governo acreditam que Eduardo Bolsonaro deu a largada do debate político, porém, suspeitam que outros interessados como as big techs americanas (empresas como Google, Meta/Facebook, Amazon) possam pegar carona e tentar se aproveitar do embate, em especial depois que o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que as plataformas que operam redes sociais devem ser responsabilizadas diretamente por postagens ilegais dos usuários. Agora, uma nova lei sobre o tema deverá ser aprovada no Congresso Nacional.

A “unidade nacional” destacada nas falas dos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), tem como pano de fundo um movimento para tentar reverter o ataque político ao Brasil, o que, se bem sucedido, contribuirá para isolar ainda mais o bolsonarismo. O risco de prejuízos econômicos “incalculáveis neste momento” pelo setor produtivo se soma à pressão direta dos segmentos prejudicados com as medidas protecionista dos Estados Unidos contra o Brasil.

No Congresso, em especial nos partidos de centro-direita, a conta é simples: impor perdas econômicas ao empresariado é algo que joga conta o desempenho de qualquer político nas urnas em 2026. O potencial de estrago com a tarifação e a ameaça de sanções ao Brasil afeta do agronegócio à indústria de tecnologia. Todos perdem. Os empresários deixaram claro nas reuniões com o governo nos últimos dias que é um jogo de perde-perde.

Investigação 
Quando avaliaram essa situação, na mesa estava apenas a tarifa de 50% a todos os produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos. Ainda não havia entrado na conta a investigação comercial contra o país anunciada pelo USTR (Departamento de Comércio dos EUA) na noite da última quarta-feira, 15.

No documento, o representante comercial dos Estados Unidos Jamieson Greer, afirma, sem apresentar nenhum dado oficial, que “tem documentado as práticas comerciais desleais do Brasil que restringem o acesso de exportadores americanos ao seu mercado há décadas”. A ação do governo norte-americano tem como base a Seção 301 da Lei de Comércio, de 1974, que trata de práticas desleais de comércio internacional contra os Estados Unidos. A legislação ampara a aplicação de tarifas e sanções comerciais adotadas pelo presidente.

O documento cita até a criação do Pix como uma possível “prática desleal”, sem especificar como. O comércio na tradicional rua 25 de Março, em São Paulo, também entrou na lista de investigação por ser considerada um exemplo de falha na aplicação adequada dos direitos de propriedade intelectual. Além do Pix e da 25 de Março, a investigação do USTR vai avaliar áreas como comércio eletrônico, tecnologia e meios de pagamento, taxas de importação e desmatamento.