Ao mesmo tempo que segurou R$ 70 bilhões em pagamentos de precatórios que deveriam ser quitados no início de 2025, o governo anunciou outras medidas com a promessa de injetar cerca de R$ 205 bilhões em recursos na economia neste ano para estimular o consumo e manter o crescimento.
Nos últimos dias, ao divulgar as estatísticas fiscais, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron (foto), enfatizou que o pagamento das ordens judiciais foi retido deliberadamente pelo Ministério da Fazenda e argumentou que a medida foi adotada para ajudar no esforço do Banco Central de desacelerar a economia e conter pressões inflacionárias.
“O valor previsto para este ano, R$ 70 bilhões, vai ser pago em julho. Mas (a postergação) ajuda a não criar pressão inflacionária neste momento”, afirmou. “Em 2024, pagamos em fevereiro”, completou.
Além disso, Ceron explicou que a execução das despesas do governo federal previstas para o ano teve um ritmo bem mais lento no primeiro trimestre, pois o orçamento para 2025 só foi aprovado pelo Congresso Nacional no final de março e sancionado pelo presidente Lula no início de abril.
No mercado, porém, há controvérsias em relação aos efeitos da decisão. “Isso não ajudou o BC em nada, porque é uma despesa que será paga e já está na conta do mercado quando avalia o tamanho do impacto fiscal para economia”, critica o diretor de um grande banco comercial.
Segundo esse diretor, se o governo estivesse realmente preocupado em ajudar no esforço desinflacionário do Banco Central, teria feito um encaminhamento fiscal diferente e não estimularia tanto o consumo. Ele diz ainda que o mercado está mais interessado nas sinalizações do comportamento fiscal para frente do que com o dado do passado, retratado nas estatísticas até o momento.
"E o governo sinaliza com mais gastos até 2026, quando haverá eleição. Há ainda a isenção do IR, o (programa) Pé-de-Meia e certamente haverá a discussão, no orçamento de 2026, de reajuste de programas sociais como o Bolsa Família", afirma.
Alta da inflação
Desde o final de 2024, preocupados com a alta generalizada dos preços e com a falta de coordenação das expectativas de investidores, analistas, economistas e empresários com a trajetória do IPCA, os diretores do BC anunciaram um choque de juros para desacelerar a economia a partir da redução do crédito e do consumo. Isso se materializou com uma sequência de três altas seguidas na Selic entre dezembro do ano passado e março deste ano.
E o Copom prometeu nova alta na reunião prevista para a semana que vem. Tudo para diminuir o ritmo de crescimento e, dessa forma, reduzir o crédito, o consumo, a produção e, na sequência, o nível de emprego.
Acontece que nesse mesmo período, o governo anunciou pelo menos três medidas para estimular o consumo, a renda e o crédito. Já de olho nas eleições de 2026, o Ministério da Fazenda deixou claro que seu modelo de desenvolvimento é baseado no consumo e no investimento produtivo privado.
Injeção de recursos
Somente as mudanças no consignado privado, modalidade de crédito que promete garantir acesso a empréstimos e financiamentos mais baratos a trabalhadores com carteira assinada do setor privado, prometem injetar R$ 120 bilhões na economia nos próximos meses.
O Ministério do Trabalho anunciou que, no primeiro mês de vigência da medida, foram liberados cerca de R$ 8 bilhões. Esse volume deverá ser incrementado nos próximos meses com a possiblidade de usar recursos do FGTS para garantir essas operações, reduzindo o risco de calote e, como consequência, os juros cobrados pelos bancos.
Além, disso, cerca de R$ 12 bilhões foram injetados na economia com a decisão de permitir que os trabalhadores que optaram pela modalidade de saque-aniversário e foram demitidos entre janeiro de 2020 e fevereiro desse ano possam receber os recursos que ficaram bloqueados. A medida atinge cerca de 12,2 milhões de trabalhadores, segundo a equipe econômica.
O governo também antecipou o pagamento de parte do 13º salário de 34 milhões de aposentados e pensionistas do INSS, o que deverá ocorrer até o início de maio. Serão mais R$ 73,3 bilhões injetados na economia.
Outra medida que deve estimular o consumo e o crédito é a criação de mais uma faixa de renda familiar que poderá se beneficiar com financiamentos habitacionais a um custo menor dentro do programa Minha Casa Minha Vida. A partir de maio, famílias com renda entre R$ 8 mil a R$ 12 mil poderão comprar imóveis de até R$ 500 mil.
“Toda movimentação no governo é para promover mais crescimento. Isso vai contra atuação do BC”, avalia o consultor e economista Sérgio Vale, sócio da consultoria MB Associados.