O presidente Luiz Inácio Lula da Silva convidou o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para viajar à Paraíba nesta quarta-feira, 28. Desta vez, no entanto, Motta deve declinar do convite, justamente para o seu estado natal, onde Lula pretende inaugurar o primeiro trecho do Ramal do Apodi, obra hídrica que integra a transposição do Rio São Francisco. A agenda política no estado de Motta está marcada para às 16h no canteiro de obras da barragem Redondo, localizada em Cachoeira dos Índios, no sertão paraibano. 

Motta, segundo interlocutores, preferiu declinar do convite por entender que precisa acelerar agendas do Legislativo. “Se a gente ficar fazendo só a agenda do presidente, vamos deixar de fazer a nossa”, disse um interlocutor assíduo do presidente da Câmara.

Ainda não foi batido o martelo sobre a recusa de Motta, mas a possível desfeita ocorre em uma contexto de total desconforto entre o presidente da Câmara e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Motta chegou a se queixar das atitudes do ministro em um almoço que teve com Lula e com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), no domingo, 25. O encontro ocorreu fora da agenda no Palácio da Alvorada.

O motivo da insatisfação de Motta é o fato de Haddad ter anunciado o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) sem ter combinado antes com os dois presidentes do Legislativo. Serviu ainda para aumentar o desconforto causado pela crítica feita pelo ministro de que o país vive hoje um “quase parlamentarismo”. No entender de Motta, Haddad, além de não combinar a medida, ainda jogou a responsabilidade de aumento da arrecadação e de responsabilidade fiscal sobre o Congresso, fator que ele considerou injusto.

Nesta segunda-feira, 26, o presidente da Câmara reagiu nas redes sociais demonstrando insatisfação com a postura do ministro, sem citar nomes. “Lembrando o que disse logo que assumi: o Estado não gera riqueza – consome. E quem paga essa conta é a sociedade. A Câmara tem sido parceira do Brasil ajudando a aprovar os bons projetos que chegam do Executivo e assim continuaremos. Mas quem gasta mais do que arrecada não é vítima, é autor. O Executivo não pode gastar sem freio e depois passar o volante para o Congresso segurar. O Brasil não precisa de mais imposto. Precisa de menos desperdício. Vamos trabalhar sempre em harmonia e em defesa dos interesses do país”, disse Motta, se posicionando contrariamente ao aumento anunciado pelo ministro.

Se realmente não acompanhar Lula na viagem, será mais um sinal de que Motta aos poucos se descola do Planalto. Outro foi dado no início do mês. Apesar da insistência do presidente, o deputado passou a incumbência de acompanhar o petista na viagem à Rússia e à China para o segundo-vice-presidente da Câmara, deputado federal Elmar Nascimento (União-BA). Motta, nesse mesmo período, esteve em Nova York.

A insatisfação de Motta abre um terreno fértil para que a oposição possa questionar os aumentos do IOF na Câmara, uma pauta que Motta deve deixar crescer nesta semana. No almoço de domingo, ele chegou a reclamar com Lula sobre os movimentos do ministro que, no seu entender, não privilegiou o diálogo que ele vem azeitando com o próprio Lula desde que tomou posse como presidente da Câmara.

Embora a insatisfação com Haddad ainda não seja tratada como uma rusga séria pelo deputado, o episódio é considerado um ponto de inflexão importante na relação com o governo e tem potencial de gerar respostas desagradáveis para o Planalto.

A oposição pretende aproveitar o clima. O senador Izalci Lucas (PL-DF) e o líder da oposição na Câmara, deputado Zucco (PL-RS), protocolaram requerimentos para convocar Haddad a dar explicações sobre o anúncio nas comissões de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) da Câmara.