O pacote anunciado pelo governo para mitigar os efeitos do tarifaço dos Estados Unidos deve aliviar setores exportadores do país, mas pode levar ainda mais adiante o estrangulamento das contas públicas e a crise fiscal. O alerta é feito por Marcus Pestana, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), que aponta um ponto cego no debate fiscal em meio ao pacote anti-tarifaço anunciado pelo governo.
Em entrevista à coluna, Pestana disse que o Brasil chega a 2025 com déficit primário recorrente desde 2014 – gestão Dilma – e que a dívida seguirá crescendo mesmo que o governo exclua as despesas do cálculo da meta fiscal.
“Na vida real, dívida é dívida. Não adianta extrair despesas da meta, porque, em certo nível, é autoengano. A PLOA é uma previsão de expectativas. Se ficar excepcionalizando despesas, aumenta a desconfiança de investidores”, afirmou.
As renúncias tributárias também preocupam. Segundo o Demonstrativo de Gastos Tributários, elas devem somar R$ 620,8 bilhões em 2026, o equivalente a 4,5% do PIB. O valor praticamente dobra em relação a 2021, quando foram R$ 307 bilhões. O economista avalia que o espaço fiscal está cada vez mais estreito. Segundo ele, a margem discricionária tende a zerar em 2027, quando quase 100% das receitas primárias líquidas estarão comprometidas com despesas obrigatórias e rigidez orçamentária.
“Esse governo não tem mais capacidade política para fazer reformas. Nossa dinâmica fiscal é insustentável. Será preciso um profundo reordenamento, senão haverá espaço zero para governar”, disse.
O pacote anti-tarifaço, lançado em 13 de agosto, prevê R$ 30 bilhões em crédito via Fundo Garantidor de Exportações, ampliação de linhas de financiamento, aumento da devolução de tributos pelo Reintegra e flexibilização de regras tributárias.
O Planalto argumenta que não há impacto direto no orçamento, já que os instrumentos já existem. Pestana discorda:
“É natural que despesas como essa fiquem de fora da meta. Mas, na prática, era para que a nossa reserva de contingência lidasse com situações não planejadas.”