Em julho do ano passado, a deputada Júlia Zanatta prometeu que deixaria a quinta posição no ranking de quem mais processa jornalistas para estar em primeiro lugar. A bolsonarista do PL de Santa Catarina cumpriu o prometido. No relatório do Monitor de Assédio Judicial contra Jornalistas de 2025, ao qual a coluna teve acesso com exclusividade, Zanatta foi a pessoa que mais processou profissionais de imprensa desde o ano passado. Foram registradas 21 novas ações movidas pela deputada, a maioria fazendo uso da justiça gratuita através dos Juizados Especiais Cíveis (JECs).
Elaborado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), o monitor desenha o cenário do assédio judicial contra a imprensa no Brasil, usado como ferramenta para intimidar e silenciar jornalistas. A primeira edição foi divulgada em 2024, com dados entre 2013 e 2023. A nova edição mostra que, de janeiro de 2024 e setembro de 2025, foram abertos 139 novos processos. Nos últimos onze anos, jornalistas e veículos de imprensa foram alvos de 784 ações no total, entre cíveis e criminais.
No ranking geral, considerando dados desde 2013, o também bolsonarista catarinense Luciano Hang é o líder, com 56 processos, dos quais 53 instaurados antes de 2024. As ações foram movidas pelo empresário, dono da rede de lojas Havan, sobretudo durante a pandemia, quando ele militava contra medidas sanitárias.
No período de onze anos, Zanatta, que é formada em Jornalismo, saltou do quinto para o terceiro lugar na contagem geral, acumulando 33 processos, dos quais 21 a partir de 2024. Do total, um processo tramita na Justiça Cível comum, sete são criminais e 13 fazem uso dos JECs, em que a deputada processa jornalistas e, mesmo que perca as decisões, não precisa pagar custas.
Além de trazer o ranking de quem mais processa jornalistas, o monitor mostra como a Justiça tem sido usada como ferramenta de intimidação. No assédio judicial, a decisão final do magistrado pouco importa para o assediador. O objetivo central é a própria tramitação do processo com vistas a intimidar o profissional ou veículo processado e espalhar o temor de ações judiciais entre toda a imprensa.
Nem todo processo contra a imprensa é entendido pela Abraji como assédio judicial. A prática se caracteriza por meio de ações repetidas contra um mesmo alvo, ou pela estratégia processual de litigante contumaz, uso do sistema criminal e pedidos de indenização excessiva, entre outros tipos.
Coordenadora jurídica da Abraji e responsável pelo relatório, Letícia Kleim afirmou que, para além do ranking e da quantificação dos processos, o estudo mostra como decisões recentes do STF de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) têm sido interpretadas nas decisões dos magistrados em primeira e segunda instâncias. Uma das decisões trata exatamente do conceito de assédio contra a imprensa.
“A aplicação das decisões ainda é bem tímida. Nos casos em que teve a aplicação, na maioria deles, a interpretação do precedente do STF foi no sentido de proteger a liberdade de expressão, mas em 38% dos casos os juízes não entenderam dessa forma”, disse Letícia.
