Líder do governo, o senador Jaques Wagner afirma que vê Lula “inteiríssimo” para disputar um novo mandato, mas admite: caso o presidente decida não concorrer em 2026, o campo progressista precisará apresentar outro nome forte. Ele relembra os bastidores da queda de Dilma Rousseff, defende que Lula não buscava foro privilegiado ao aceitar a Casa Civil e diz que o PT se contaminou com a lógica da sobrevivência eleitoral.

A entrevista com o titular desta coluna foi para o canal Amado Mundo, no YouTube (youtube.com/@amadomundo), e aconteceu no gabinete da Liderança do Governo, no Senado.

Você teria disposição de concorrer à Presidência em 2026? Não seria arriscado para o país um novo mandato do Lula, considerando a responsabilidade da Presidência e a necessidade de renovação na esquerda?
De vez em quando vou lá na Alvorada, de manhã cedinho, para fazer ginástica com ele. Ele faz todo dia, às dez para as seis, na sala de ginástica. Eu vejo ele todo dia: são 30, 40 minutos na esteira, andando, depois correndo, depois musculação, alongamento. Sinceramente, pela minha constatação, ele está inteiríssimo para ser candidato. A decisão é dele, evidentemente. Acho que hoje o nome mais forte é o dele.

Olhando para 2030, quem é o nome do campo progressista? Flávio Dino foi para o STF. Haddad enfrentará resistência no partido. Quem vislumbra?
É óbvio que temos alguém que lidera o processo, no caso, o presidente Lula. Precisamos ouvir dele o que está pensando. Ele não vai falar agora, talvez só no final do ano, ou no ano que vem, porque, querendo ou não, em abril já é preciso ter o candidato anunciado — seja ele ou outro. Por isso não gosto de entrar nessa conversa de “você toparia ou não toparia”. Eu digo: o meu candidato é ele.

E você fala com o Flávio Bolsonaro, né?
Eu falo com todo mundo. Fui quatro anos oposição a eles. Mas faço a seguinte pregação: quem já foi Executivo, quando perde e vai para a oposição, não tem o direito de fazer oposição desconhecendo as dificuldades de quem governa. Não dá para, só porque mudou de lado, adotar a lógica do “quanto pior, melhor”.

O governo desistiu de formar uma frente com o Centrão para o ano que vem?
Não. O que aconteceu em São Paulo, na filiação, onde estavam o atual governador e outros membros do Senado e da Câmara, foi a formação de uma frente anti-Lula. Acho que tem que ser uma frente pró alguma coisa, não contra alguém. Insisto que, num tempo de redes, as pessoas vivem de clichês. Precisamos aprofundar e esclarecer os temas, ter racionalidade no debate. Em democracia, você não sai com 100%. Isso é território do autoritarismo. Eu vou continuar trabalhando assim. Carrego comigo a coragem — não a valentia — do meu pai, que lutou contra os nazistas, e o espírito conciliador da minha mãe. Tento misturar os dois.

Lula assinando o projeto de lei que institui o feriado de 2 de Julho ao lado de Jaques Wagner e Rui Costa

Lula assinando o projeto de lei que institui o feriado de 2 de Julho ao lado de Jaques Wagner e Rui Costa.   Foto: Ricardo Stuckert/PR

Falando do governo Dilma, de quem você foi chefe da Casa Civil e ministro da Defesa. O que deu errado?
A oposição se apresentou para dar aquele golpe, aquele impeachment, para tirar ela da presidência, eleita legitimamente. Aproveitaram um momento de baixa popularidade, com a economia sem deslanchar, e trabalharam em cima disso. Foi uma programação das oposições. Cheguei a ter diálogo com o então vice-presidente, Michel Temer, e disse: “Espero que você não aceite esse convite.”

E o que ele respondeu?
Na época, no Jaburu, ele me disse: “Estou com idade, não estou a fim desse tipo de aventura.” Depois, imagino que sofreu pressão do partido dele e de outros e acabou assumindo. Acho que foi um momento de quebra da democracia brasileira. Não havia crime de responsabilidade cometido por ela, assim como aconteceu com a prisão do Lula, que acabou sendo inocentado pelo Supremo Tribunal Federal.

Vocês erraram na estratégia com o Eduardo Cunha?
Tentei muitas vezes conversar com ele, atender pedidos sobre a manutenção de acordos que ele tinha feito. Falei com a Dilma que não deveria vetar, e ela não vetou. Mas a ânsia pelo poder foi contaminando aquilo. O estilo dela era mais duro, e muita gente se insurgiu por causa disso. Entrei em outubro, cumpri meu papel, melhorei o ambiente até fevereiro ou março. Procurei o presidente Lula, que não queria assumir a Casa Civil, e disse: “Presidente, eu me conheço, sei meu tamanho e sei o seu.” Saí da Casa Civil e fui para a chefia de gabinete. Conversei com ele várias vezes, até que ele, eu diria, sucumbiu. Infelizmente, o Supremo entendeu que ele queria se abrigar no cargo para não ser preso. Isso não tinha nada a ver. Fui várias vezes conversar com ele, e ele resistia. Dizia: “Galego, não vai ter dois presidentes, eu no quarto andar, ela no terceiro.”

Se ele tivesse entrado, teria salvado o governo?
Acho que a chance era grande. Ele tinha capacidade de diálogo e o respeito de muitos parlamentares. Talvez por isso o Supremo resolveu dizer que ele estava indo para se esconder, e nunca foi isso. Quem sabe disso sou eu, que conversei muito com ele para que aceitasse. A oposição inventou essa história. Em nenhum momento ele iria para lá com esse intuito. Quando finalmente se convenceu, interditaram a ida dele. Aí começaram a trabalhar pelo impeachment. Não diria que erramos com Eduardo Cunha. Conversei com ele e com emissários. Mas havia limites.

Com o histórico do partido no governo, houve algum momento em que você pensou que o PT se perdeu?
Partido político não dá caráter a ninguém. Caráter é seu código de ética. Partido não tira você do caminho, nem coloca em outro. Vi os erros de muitos. Muita gente achou que a única forma de sobrevivência era jogar um jogo parecido. O PT, assim como o PSDB, nasceu com a lógica da transparência, do combate à corrupção. Por isso, quando alguém do PT é pego, o desgaste é maior. É diferente de quem já opera dentro desse sistema. Não aponto o dedo, mas a chegada do PT à disputa de cargos acabou contaminando alguns.