Apesar das frustrações e impasses na COP30, a participação de Marina Silva (Meio Ambiente) na conferência realizada no Pará evidenciou uma diferença importante na atuação recente da ministra em comparação com outros momentos de sua trajetória – inclusive na relação com o chefe, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Se há 17 anos, no segundo mandato de Lula, Marina colocou as divergências à frente e entregou o cargo no governo por discordar de decisões do governo, nos últimos tempos ela tem assumido uma versão bem mais moderada. Na COP, se dedicou a negociar pacientemente o texto final da conferência, fazendo concessões para tentar chegar ao esperado consenso.
O novo momento de Marina também ficou patente nos debates sobre a exploração de petróleo na chamada Margem Equatorial, na foz do rio Amazonas. Com a benção de Lula, o Ibama autorizou a Petrobras a iniciar as pesquisas na região, contrariando uma parte significativas das principais entidades ambientalistas. Ao menos publicamente, Marina não opôs resistência.
A versão “paz e amor” de Marina, referência internacional no debate ambiental, não significa necessariamente que as divergências de entendimento entre ela e Lula terminaram. O que mudou, na verdade, foi a estratégia política da ministra.
Em 2008, Marina e seus aliados não concordavam com o que entendiam ser um esvaziamento do ministério promovido pelo então presidente. À época, entre outras medidas, Lula estava disposto a transferir o Plano Amazônia Sustentável, gestado pela ministra, para o então chefe da Secretaria Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger.
Marina deixou o cargo com uma carta repleta de críticas ao governo. No texto, atribuiu a decisão às “dificuldades que tenho enfrentado há algum tempo para dar prosseguimento à agenda ambiental federal”. Àquela altura, ela se opunha também a projetos do chamado PAC, o Plano de Aceleração do Crescimento, entre eles a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, motivo de embates públicos com a então chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Na outra ponta, a ministra e seu time eram acusados pelo próprio Lula de emperrar a veia desenvolvimentista do governo.
Agora, no caso da exploração de petróleo na Margem Equatorial as críticas de Lula não foram muito diferentes enquanto não saía a autorização. Não faz muito tempo, ele acusou o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) de fazer “lenga-lenga” com a licença. As pressões sobre o órgão resultaram na emissão da autorização, às vésperas do início da COP em Belém. O que mudou, desta vez, foi a postura de Marina: ela acabou adotando o discurso do próprio Lula, repetindo a cada entrevista que “não se trata de dizer apenas que não pode, mas como pode” explorar petróleo na área.
A opção pelo rompimento em 2008 acabou levando Marina e seus aliados mais próximos a criar pouco depois um partido próprio para defender suas ideias, o Rede Sustentabilidade. Hoje, há divergências marcantes entre as posições do partido e as da própria ministra: a postura mais conciliadora da Marina de hoje é minoritária. Em abril deste ano, um congresso nacional da Rede aprovou por mais de 70% dos votos uma tese que defendia uma posição mais à esquerda e voltada para o enfrentamento. Marina ficou na parte perdedora.
“Marina sempre foi muito conciliadora e continua sendo. Eu acho apenas que ela, agora, colocou como objetivo terminar o mandato [de ministra], coisa que não tinha feito no segundo governo Lula. Ela está se esforçando nesse sentido”, diz, sob reserva, um antigo companheiro da ministra na Rede.
Para aliados, no caso da Margem Equatorial falam mais alto para a ministra hoje as questões relacionadas à floresta do que propriamente as que tratam da questão do petróleo – daí a condescendência com as pressões de Lula em favor do pedido da Petrobras.
Um exemplo da moderação da ministra na questão ambiental foi um texto apresentado pela presidência brasileira da COP30 na última sexta-feira, 21, que excluiu a expressão “combustíveis fósseis”, desagradando mais de 30 países já haviam considerado insuficiente a proposta de acordo. Após a divulgação, Marina se reuniu com negociadores dos quase 200 países que participam da conferência para ouvi-los. Em outros tempos, ela provavelmente estaria do lado oposto.
