Depois de dois meses de desgaste público pela alta no preço dos alimentos, o governo fez, nesta quinta-feira, 6, o primeiro movimento concreto para tentar atacar a inflação que pesa na mesa e no bolso dos brasileiros e penaliza o presidente Lula nas pesquisas de avaliação da sua gestão.
Após uma reunião de quase três horas (foto) no Palácio do Planalto que contou com cinco ministros de Estado, entre eles o vice-presidente Geraldo Alckmin (também titular da pasta do Desenvolvimento, Indústria e Comércio), doze secretários dos ministérios, o presidente da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) e mais de 20 representantes do setor produtivo e de entidades setoriais, foi anunciada a estratégia oficial que, na prática, aumenta a pressão sobre a indústria nacional por mais concorrência, mas que ainda levará um tempo para chegar ao consumidor final.
Sem a presença do presidente Lula e do ministro Fernando Haddad (Fazenda), foram definidas 5 frentes de atuação: i) redução de alíquota de importação de dez produtos, entre eles café e carne, alguns dos vilões da inflação nos últimos meses; ii) aumento das facilidades para que produtos específicos sujeitos a limitações de inspeções municipais ou estaduais possam ser comercializados em todo país; iii) criação de um mecanismo, via aplicativo de celular, de comparação de preço para orientação dos consumidores sobre onde é possível comprar produtos mais baratos; iv) mais financiamentos, no Plano Safra 2025/2026, para produtos da cesta básica; e v) fortalecimento da Conab para criação de estoques reguladores de preços.
O custo para as contas públicas da iniciativa de zerar a alíquota de importação de produtos como café, açúcar, carne, azeite e milho não foi divulgado.
Nenhuma das medidas terá efeito imediato, com reflexo na inflação no curtíssimo prazo e, tampouco, estava contemplada no conjunto de 20 propostas encaminhadas pelo setor produtivo nos últimos dias ao governo. Capitaneadas pela Frente Parlamentar da Agropecuária, tendo à frente o deputado Pedro Lupion (PP-PR), as sugestões destacavam a necessidade de o governo promover ajuste fiscal para minimizar o impacto do dólar nos insumos agrícolas, além de reduzir tributos, ampliar subvenções do seguro rural, expandir ferrovias, recuperar rodovias e aumentar a capacidade de armazenagem. Os empresários voltaram a propor a revisão de normas de validade dos alimentos que podem ser comercializados, ideia que teve repercussão amplamente negativa quando foi tornada pública algumas semanas atrás e que já havia sido descartada pelo governo.
Os setores produtivos, agora, terão que lidar com mais concorrência interna e externa. Entre os dez produtos listados pelo governo, nove tiveram a alíquota de importação zerada, derrubando uma barreira que protegia a indústria nacional de competição com importados. Nessa lista estão: carnes, café, açúcar, milho, óleo de girassol, azeite de oliva, sardinha, biscoitos e massas alimentícias. No caso do óleo de palma, a cota de importação foi aumenta de 65 mil toneladas para 150 mil.
A intenção do governo com o pacote de medidas é ampliar a oferta de determinados produtos aos consumidores. Esse é o objetivo, por exemplo, da permissão para que alguns itens (que ainda serão anunciados pelo Ministério da Agricultura) registrados no Sistema Brasileiro de Inspeção possam ser comercializados nacionalmente, independente do tipo de selo de inspeção que eles possuem (municipal, estadual ou federal). Atualmente, se um determinado produto tem registro estadual ou municipal, por exemplo, ele só pode ser vendido no estado ou cidade onde é produzido. Com a mudança, poderá ser vendido em todo Brasil.
O governo também quer pressionar os estados para reduzir a cobrança de ICMS sobre produtos da cesta básica e criar um aplicativo nacional que, a partir do uso da geolocalização, informará aos consumidores onde ele poderá comprar mais barato.
Quando tudo isso se traduzirá em preços menores nas prateleiras dos supermercados, no entanto, é mais difícil precisar. Algumas medidas levarão tempo para serem implementadas e o governo precisará continuar lidando com a realidade atual: a inflação dos alimentos está em destaque no noticiário e nas conversas nas filas dos supermercados.
O governo, também, anunciou que mais medidas deverão ser implementadas, o que faz com que o tema siga no radar muito mais como problema do que com solução com resultados práticos. Também pesa contra a imagem do governo o fato de o Banco Central precisar seguir elevando a taxa de juros para frear o crescimento da economia e segurar os preços. Esse aspecto pesa, no curtíssimo prazo, nas avaliações da gestão e da popularidade do presidente Lula.