Com bastidores animados e disputa de lobbies em Brasília, o leilão do megaterminal Tecon Santos 10, no Porto de Santos, colocará à prova o alinhamento entre o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e o Tribunal de Contas da União (TCU) nos últimos anos. Desde 2020, conforme constatou a coluna a partir de um levantamento processual, o órgão antitruste e a corte de contas costumam ter posicionamentos afinados.

O caso do megaterminal santista é um em que já houve diferenças entre o Cade e a área técnica do TCU. Como tem noticiado a coluna, estão sob escrutínio no caso do Tecon Santos 10 duas possibilidades para o leilão, marcado para dezembro: um modelo mais restritivo, em que empresas que já operam no porto seriam impedidas de participar de uma primeira fase da disputa e só entrariam em uma segunda etapa, caso não haja vencedor na prévia; e um modelo mais amplo, em que as companhias “veteranas” do porto poderiam disputar o contrato do megaterminal sem qualquer limitação.

Entre as empresas que já operam no Porto de Santos e desejam entrar na concorrência sem amarras estão Santos Brasil, Maersk e MSC. Do outro lado, estrangeiras como China Merchants, CCCC e ICTSI defendem as restrições.

No mais recente movimento de órgãos oficiais sobre o tema, na quarta-feira, 24, o Cade publicou uma nota técnica que reforçou uma visão distinta da apresentada pela área técnica do TCU.

Em 2022, o Cade havia se manifestado no sentido de que haveria grande risco de concentração de mercado caso as empresas que já operam no porto pudessem participar do leilão do Tecon Santos 10. Em nota técnica publicada na última quarta, o órgão foi mais brando ao apontar “riscos potenciais” à concorrência, ponderando que tais riscos são apontamentos preliminares, praxe em suas análises, e que não configuram obrigatoriamente um dano concreto.

O documento ainda avaliou o que aconteceria caso um operador já instalado no porto vencesse a disputa. Medidas drásticas, como obrigar a venda de ativos, foram consideradas desproporcionais. O Cade defendeu, em vez disso, o uso de ajustes de conduta, como garantir acesso a concorrentes, evitar contratos de exclusividade ou impor maior transparência nas operações.

A divergência entre Cade e a área técnica do TCU se dá porque, em 2023, os especialistas da corte de contas apoiaram uma minuta do Ministério de Portos e Aeroportos que não previa nenhuma restrição à participação de empresas na concorrência pública pelo terminal.

Essa posição do ministério contrastou com uma medida posterior, de 2024, da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), vinculada à própria pasta. A Antaq endureceu as regras e limitou a participação das “veteranas” do porto de Santos. Foi esse movimento que levou o TCU a decidir travar o edital e pedir a nova manifestação do Cade, publicada nesta semana.

O histórico mostra que, fora do caso do Tecon Santos 10, TCU e Cade costumam tomar decisões afinadas. Levantamento feito pela coluna entre 2020 e 2025 localizou diversos exemplos da convergência e somente um de divergências completas. O único caso ocorreu em 2020, quando o TCU deixou claro não investigar cartel no setor de licitações públicas, para não invadir a competência do Cade.

O leilão do megaterminal em Santos está marcado para a terceira semana de dezembro. O TCU tem até esse prazo para tomar uma decisão a respeito da concorrência. Enquanto isso, o certame segue travado. O Ministério de Portos e Aeroportos tem até o fim desta sexta-feira, 26, para dar seu parecer ao TCU, que avaliará a posição dos entes para emitir sua posição. Avaliado em R$ 43,6 bilhões por 25 anos de concessão, o Tecon Santos 10 é o ativo mais cobiçado da agenda portuária brasileira.