Morreu nesta segunda-feira, 28, no Rio, um dos maiores jornalistas do país. Marcelo Beraba, 74, comandou redações de Folha, O Globo, Estadão e Jornal do Brasil e foi o idealizador e um dos fundadores da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).

Não à toa, Beraba era chamado de mestre, com carinho, por centenas dos jornalistas que ele formou e influenciou com sua visão precisa e refinada sobre o ofício. Mestre era o modo também com que ele chamava os colegas, reflexo do jeito com que olhava todos na profissão: dos diretores aos estagiários. Quem via a postura aberta e sorridente com que lidava com os iniciantes não supunha sua extensa carreira, de mais de 50 anos.

Na direção das principais redações, formou equipes e desenhou coberturas de grandes acontecimentos e reportagens com precisão, sempre pautado pela ética, pela sensibilidade e pelo olhar crítico que não podem faltar ao bom jornalismo.

Defensor incansável da liberdade de imprensa, Beraba via no jornalismo investigativo uma ferramenta essencial para o aprimoramento da democracia. Foi na Folha de S.Paulo, aliás, que ele coordenou a cobertura da primeira eleição direta desde a ditadura militar, que culminou com a eleição de Fernando Collor, em 1989.

Beraba começou sua carreira em 1971 como repórter aprendiz, em O Globo, no Rio. Dez anos depois, em um de seus grandes furos, levou para a redação a fotografia do capitão terrorista ferido no atentado do Riocentro.

De 2008 a 2019, quando se aposentou, Marcelo Beraba esteve à frente do Estadão, onde comandou e montou equipes de reportagem. Deu atenção especial ao jornalismo de dados e tinha o rigor na apuração como uma de suas balizas.

Foi professor em diferentes instituições acadêmicas, entre elas a PUC-Rio e o Instituto de Desenvolvimento e Pesquisa (IDP). Neste último, foi o decano e referência acadêmica de uma pós de jornalismo investigativo em plena pandemia (o titular desta coluna foi coordenador acadêmico do curso) .

Mas era no dia a dia que ensinava as mais preciosas lições. Ao titular desta coluna, deu dezenas de conselhos e ensinamentos, sempre com sinceridade e gentileza. A Abraji era um tema recorrente dessas conversas.

Beraba sempre participou de momentos-chaves da gestão na Abraji, mesmo quando não compunha mais a diretoria. O amor de Beraba pela organização, pelo jornalismo, pelo ofício de repórter e edição, foram combustível para uma geração de jornalistas que, apesar dos desafios da atividade, optam diariamente por exercer o ofício com dignidade, responsabilidade e empenho.

Nos últimos anos, sua atenção estava voltada para a formação profissional de mais e mais jornalistas, em todo país, de diferentes origens, classes sociais, cores, gêneros. Por mais atribulada que fosse sua agenda, não recusava convite para viajar aonde fosse e passar um pouco do seu conhecimento a um novo repórter.

Beraba também conquistou respeito internacional, e foi uma referência do jornalismo latino-americano. Foi peça importante no sucesso do peruano Instituto Prensa y Sociedad (Ipys), uma das mais importantes organizações de defesa do jornalismo no continente.

Ele será velado no Rio, no memorial do Carmo, no Cemitério do Caju, da 12h30 às 15h30 dessa quarta-feira, 30. Beraba deixa a viúva, a jornalista Elvira Lobato, duas filhas, dois enteados e três netos. E uma legião de admiradores que só temos a dizer uma frase. “Obrigado, mestre.”