O Ministério Público Federal, os Ministérios Públicos de Minas Gerais e do Espírito Santo, bem como as defensorias públicas estaduais e a Defensoria Pública da União, ajuizaram uma ação civil pública contra o escritório britânico Pogust Goodhead. Ele foi acusado de impor cláusulas abusivas em contratos firmados com vítimas do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em 2015.
A petição inicial da ação, à qual a reportagem teve acesso, denuncia práticas que estariam prejudicando milhares de brasileiros em situação de vulnerabilidade. Em nota à coluna, o escritório de advocacia afirmou ser vítima de “lawfare”.
Segundo a ação, que foi ajuizada na quinta-feira, 15, o escritório estrangeiro firmou contratos com atingidos pelo desastre oferecendo representá-los em uma ação coletiva movida no Reino Unido contra a mineradora BHP Billiton. Mais de 700 mil pessoas estão incluídas nesse processo internacional. A ação contesta os termos contratuais por, supostamente, impor obrigações que restringem a autonomia dos clientes e violam o direito de acesso à Justiça.
Entre as cláusulas apontadas como abusivas estão a cobrança de honorários sobre indenizações recebidas no Brasil — inclusive aquelas em que o escritório não teve participação —, a impossibilidade de rescisão contratual pelos clientes, a exigência de litígio exclusivamente na Inglaterra e a obrigatoriedade de arbitragem em Londres. Os contratos também estipulam que qualquer indenização recebida no Brasil pode ser considerada “vitória” na ação inglesa, gerando automaticamente pagamento de honorários ao Pogust Goodhead.
Na ação civil pública, o MP alega que o escritório britânico, atuando por meio do Hotta Advocacia no Brasil, tem feito campanhas que desencorajam os atingidos a aderirem aos programas de indenização brasileiros, como o Programa de Indenização Definitiva (PID) e o Agro Pesca. A ação argumenta que essa interferência compromete a efetividade dos acordos firmados no país e homologados pelo Supremo Tribunal Federal, destinados à reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem.
Leia a íntegra da nota do Pogust Goodhead:
• O Pogust Goodhead não foi notificado oficialmente e conhece apenas as informações veiculadas na imprensa.
• Faltando menos de 10 dias para o fim do prazo de adesão ao PID, o escritório Pogust Goodhead é mais uma vez alvo de uma campanha de lawfare. Tal estratégia, como em episódios anteriores, visa a prejudicar o direito – já reconhecido pela Justiça inglesa – dos atingidos de buscarem uma indenização integral e pressionar os mesmos a aceitarem os termos de um acordo incompatível com os danos sofridos.
• Os contratos do PG são regidos pela lei inglesa e estão em vigor desde 2018, mas somente agora estão sendo questionados. Isso porque foi constatado que o PID não teve a adesão massiva esperada e que centenas de milhares de pessoas decidiram continuar litigando na Inglaterra em busca de reparação integral.
• Em cumprimento com sua função de advogados, o Pogust Goodhead vem ativamente esclarecendo seus clientes sobre as condições e consequências da eventual adesão à repactuação que, de acordo com os termos impostos pelas mineradoras, obriga os aderentes a renunciarem a ações judiciais no Brasil e no exterior caso optem por programas como o PID. Diante disso, o Comitê representativo dos clientes aprovou, em 26 de fevereiro e por unanimidade, uma resolução recomendando aos atingidos a não-adesão aos referidos programas.
• Diversas autoridades públicas brasileiras, incluindo o presidente do STF em ao menos três ocasiões, já admitiram que a existência do processo na Inglaterra exerceu uma pressão decisiva para que o acordo no Brasil fosse concluído, depois de quase uma década de idas e vindas nas negociações.
• No acordo da repactuação, as mineradoras impuseram critérios rígidos de elegibilidade que deixaram de fora mais de 400 mil autores da ação contra a BHP em Londres. Esses atingidos têm o processo inglês como único meio para buscar reparação pelo maior crime ambiental da história do Brasil.
• Em relação à atualização dos contratos com o Pogust Goodhead, não há qualquer mudança material nas condições nem nos percentuais a serem cobrados pela firma, que recebe honorários apenas em caso de êxito e, para indígenas e quilombolas, atua pro-bono.