Vencedor do Prêmio Jabuti deste ano na categoria Escritor Estreante, o médico Marcelo Henrique Silva mergulhou nos anos 1980 e 1990 para escrever sobre a história da chegada do HIV no Brasil. “Sangue neon” se inspira na jornada da travesti Brenda Lee, assassinada em 1996, para costurar enredos e depoimentos que traçam o cenário assustador de como a Aids apavorou, sobretudo, a comunidade homossexual e transexual e como essa comunidade se organizou para reagir.
Pernambucana, Brenda Lee se mudou para São Paulo e lutou contra preconceitos e dificuldades vividas pelas pessoas trans. Mas conseguiu comprar imóveis e montou uma pensão em São Paulo para abrigar travestis que enfrentavam a rejeição de suas famílias. Quando surgiu a epidemia da Aids e do HIV, a casa se tornou um local de acolhimento para quem chegava à cidade em busca de tratamento. Era o Palácio das Princesas, um casarão que resiste até hoje no bairro do Bixiga.
“O livro foi inspirado na história dela. É um livro de ficção inspirado em histórias reais, de como as pessoas reagiram e se organizaram para enfrentar um mal que o Estado não tomou responsabilidade na época ou demorou muito para tomar responsabilidade”, disse Silva à coluna.
Com uma carreira iniciada como médico da família, o autor usou sua vivência na pandemia da Covid-19 para escrever o livro. “Quando eu me formei, começou a pandemia. Então, eu coloquei um pouco da minha experiência, também, diante desse enfrentamento de uma coisa desconhecida, de um mal desconhecido”, afirmou, destacando a luta de jovens médicos na época, que foram ouvidos para “Sangue neon”.
Gay, o mineiro de 32 anos voltou seu olhar para a comunidade trans e faz questão de dizer: “Não existe LGB sem T”. A frase é uma contestação ao movimento internacional que tenta separar as pessoas trans e fragmentar a sigla LGBTQIAPN+.
“Só para a gente pensar, olha essa sopa de letrinhas. A gente não tem nada a ver um com o outro. Qual é a única coisa que une essas letras todas? É a violência. Então, essa sigla é uma forma de enfrentar a violência. E a gente consegue fazer isso se articulando, com união e com respeito”, avaliou.
No ano passado, o manuscrito de “Sangue neon” ganhou o primeiro Prêmio Alta de Literatura e, assim, a chance de ser publicado pela AltaBooks, com a editora Faria e Silva. Agora, a esperança do escritor é que o prêmio Jabuti ajude a abrir portas.
“Quero fazer experimentações. Estou pensando em um livro de contos”, disse Marcelo Henrique Silva, que atua como radiologista de oncologia na rede pública de Belo Horizonte.
