Passados onze meses desde que o governo Lula anunciou que estudaria mudanças nas regras do PAT, o Programa de Alimentação do Trabalhador, o presidente assinou nesta terça-feira, 11, um decreto com novas normas. A publicação do texto no Diário Oficial da União foi programada para esta quarta, 12. Mas a “novela” em torno das normas que disciplinam a concessão do vale-alimentação e do vale-refeição não deve acabar tão cedo. Uma parte das empresas do setor está insatisfeita e não descarta recorrer ao Poder Judiciário, segundo executivos ouvidos pelo PlatôBR.
Responsáveis pela formatação do decreto, o Ministério da Fazenda e o Ministério do Trabalho limitaram a 3,6% a taxa de desconto — conhecida no mercado como MDR (Merchant Discount Rate) — cobrada de bares, restaurantes e supermercados nas vendas com os cartões de benefícios. Além disso, o governo reduziu o prazo que as empresas de benefícios têm para repassar o dinheiro dessas vendas para os estabelecimentos. Pela norma vigente, o repasse é feito para os lojistas 30 dias após a venda. Agora, o tempo máximo será de 15 dias corridos. As empresas têm 90 dias para se adequar.
Atualmente, quando fazem uma venda no cartão, supermercado, bares e restaurantes têm necessariamente que pagar uma taxa sobre o valor recebido. Essa taxa serve para remunerar os três elos da cadeia de cartões: a empresa da maquininha, o banco emissor do cartão e a bandeira (Mastercard, Visa e Elo são as maiores do país). A empresa de maquininhas é responsável por recolher a taxa e repassá-la aos demais participantes da operação.
Abertura dos arranjos
No caso do setor de benefícios, as empresas tradicionais – como Alelo, Sodexo, Ticket e VR – atuam por meio do que o setor chama de arranjo fechado de pagamento. Cada companhia tem liberdade para definir sua taxa. As empresas de maquininhas, nesse caso, são apenas um intermediário no processo, responsáveis por processar a transação, e são remuneradas por cumprir essa função.
Pelo modelo atual, as empresas de benefícios fazem individualmente o credenciamento de bares, restaurantes e supermercados que podem aceitar os VRs e VAs. Assim, os cartões das diferentes empresas só são aceitos nos estabelecimentos cadastrados.
Agora, o governo determina o fim dos arranjos fechados para que todos os beneficiários dos VRs e dos VAs possam comprar alimentos em todos os bares, restaurantes e supermercados, independentemente se são credenciados ou não pelas operadoras dos cartões de benefícios.
Em até 360 dias, todo cartão do PAT deverá funcionar em qualquer maquininha de pagamento. Para empresas de benefícios com mais de 500 mil clientes que atuam no modelo fechado, a mudança deve ocorrer em até 180 dias. Contratos em desacordo com as novas regras não poderão ser prorrogados, e as empresas terão prazos de transição até 360 dias. Os arranjos de rede fechada continuam permitidos apenas para operadoras que atendam até 500 mil trabalhadores.
“Isso amplia a concorrência e reduz a concentração de mercado, uma vez que, no arranjo fechado, as funções de instituidor, emissor e credenciador podem ser exercidas pela mesma empresa”, defendeu o Ministério do Trabalho, em nota.
Na avaliação de uma parte dos empresários do setor, porém, com o decreto o governo interfere na livre iniciativa e nas regras de mercado, o que cria insegurança jurídica para diversos contratos vigentes. Com isso, recorrer ao Judiciário é uma alternativa para evitar prejuízos às empresas, afirmaram quatro executivos consultados.
Assinatura a portas fechadas
A previsão inicial do governo era de que o decreto presidencial fosse assinado em uma cerimônia no Palácio do Planalto, aberta ao público. Um convite formal do Ministério da Fazenda e do Ministério do Trabalho chegou a ser enviado para as empresas do setor. Entretanto, a repercussão negativa levou o governo a cancelar o evento no Planalto e transferir a assinatura para o Palácio da Alvorada, em um evento fechado.
Participaram da assinatura o próprio presidente Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin e os ministros Luiz Marinho (Trabalho), Fernando Haddad (Casa Civil) e Rui Costa (Casa Civil), além do presidente da Abras (Associação Brasileira de Supermercados), João Galassi.
