A entrega do relatório final do inquérito sobre a tentativa de golpe, com o indiciamento de Jair Bolsonaro e mais 36 pessoas, marca a despedida do delegado Rodrigo Morais Fernandes da poderosa Diretoria de Inteligência da Polícia Federal, a DIP, centro nervoso das investigações que miram o ex-presidente e seus aliados.
Aos 51 anos, Rodrigo Morais vai assumir o cargo de adido da PF em Londres, na Inglaterra. Deverá substituí-lo o delegado Leandro Almada da Costa, atual superintendente da corporação em Brasília.
Com perfil discreto, o mineiro Morais é homem de estrita confiança do atual diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues. Ele está no comando da DIP desde o começo do governo Lula, quando Rodrigues foi nomeado para a direção.
A discrição de Morais chama atenção até nos momentos mais críticos. Na quinta-feira passada, 14, por exemplo, Andrei Rodrigues marcou uma entrevista coletiva para falar do atentado a bomba na Praça dos Três Poderes. Ao seu lado, diante das câmeras e holofotes, havia dois delegados. Rodrigo Morais está lá, mas nos bastidores – para aparecer na entrevista ao lado do chefão, designou um subordinado.
A DIP é responsável pelas investigações mais sensíveis de toda a Polícia Federal. Não por acaso, foram seus investigadores os designados, de imediato, para o caso do atentado. A equipe comandada por Morais também está à frente, desde o ano passado, das apurações que miram os atos antidemocráticos e de tudo o que envolve o ex-presidente Jair Bolsonaro. Além disso, também contribuiu com a investigação, a cargo de policiais do Rio, em que a PF apontou os mandantes da morte da vereadora Marielle Franco.
No caso da apuração sobre a tentativa de golpe, o trabalho de inteligência foi fundamental para ligar uma série de pontas – uma delas, a que resultou na operação terça-feira passada, que revelou um plano para matar Lula, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes.
Coube ao time de Morais mapear a trama, desde o percurso dos, a partir da quebra de sigilo das antenas de telefonia celular, até a descoberta de que o plano do atentado foi impresso dentro do Palácio do Planalto e depois levado ao Alvorada.
Antes, os policiais da DIP atuaram na identificação dos envolvidos nas invasões do 8 de janeiro, na apuração sobre as fraudes nos cartões de vacinação do estado-maior bolsonarista e nas transações com as joias recebidas por Bolsonaro enquanto era presidente. Por fim, amarraram todas as frentes no relatório final da tentativa de golpe enviado dias atrás ao outro Moraes, o do STF.
Não foram os primeiros casos envolvendo presidentes e presidenciáveis da carreira do delegado Rodrigo Morais. Antes, ele foi responsável pela investigação sobre a facada no então candidato Jair Bolsonaro em Juiz de Fora, durante a campanha eleitoral de 2018. Como concluiu que o autor do atentado, Adélio Bispo, agiu sozinho e que não houve mandante, o delegado acabou virando alvo do próprio Bolsonaro.
A apuração da facada foi concluída em 2018 e reaberta em 2020, já durante o governo de Bolsonaro. A conclusão se repetiu: Adélio agiu sem ajuda de terceiros e não houve mandantes.
Inconformado, o então presidente passou a atacar o delegado. Notícias falsas contra ele se espalharam pela internet.
Ainda no governo Bolsonaro, Morais saiu de cena. Após a nova conclusão do inquérito, foi nomeado para uma temporada em Nova York, como oficial de ligação brasileiro junto a uma força-tarefa de combate à lavagem de dinheiro liderada pelos Estados Unidos.
De volta ao Brasil, e no comando de uma das diretorias mais importantes da PF, o delegado seguiu na mira de Bolsonaro. No mês passado, por sinal, o ex-presidente questionou a ida de Morais para Londres. Não houve resposta ao ataque. A discrição mineira do policial prevaleceu.