Afonso Borges, jornalista e gestor cultural que criou o festival Sempre Um Papo, encontrou recentemente um registro da passagem de Mario Vargas Llosa por Belo Horizonte. Um dos principais responsáveis pela escalada da literatura latino-americana no século 20, Vargas Llosa, que morreu no domingo, 13, veio ao Brasil em 1994 para participar de um debate sobre literatura a convite de Borges, mas acabou tendo que lidar com uma situação que o deixou… totalmente contrariado.

Na imagem recém-encontrada por Borges (foto abaixo), o autor peruano é visto em uma mesa dando autógrafos. Logo após ter perdido as eleições presidenciais do Peru, em 1990, Vargas Llosa começou a trabalhar no livro "Um peixe na água", lançado quatro anos depois. Foi quando Borges o convidou para participar de uma conversa organizada pelo Sempre Um Papo no extinto Teatro Clara Nunes, na capital mineira.

Mário Vargas Llosa dando autógrafos no Teatro Clara Nunes, Belo Horizonte, em 1994. Foto: Divulgação.

O que o autor não queria era lidar com uma fila enorme de pessoas pedindo por autógrafos ao final do evento. A princípio, se recusou a assinar os livros, demonstrando evidente descontentamento a Borges. Mas o jornalista explicou que atender os presentes era um ritual que fazia parte de toda edição do Sempre um Papo, e com Vargas Llosa não seria diferente.

O peruano ficou até as 23h naquela noite dando autógrafos para 500 pessoas.

Contou Afonso Borges à coluna:

"Ele não queria de jeito nenhum, falou comigo 'sólo la firma, sólo la firma'. Contrariei na hora e dei início à sessão de autógrafos. Ele me olhou furioso."

Borges lembrou que, na época, mal tinha dinheiro para financiar os projetos do festival. Ao final do evento, precisava acompanhar Vargas Llosa até o hotel Othon e ainda nem tinha carteira de motorista. Tarde da noite, ficou esperando um táxi com um carrancudo Vargas Llosa.

O que transformou a expressão de Vargas Llosa foi uma menção feita por Afonso Borges a um certo mineiro.

"Gosta de Guimarães Rosa?".

O rosto de Vargas Llosa perdeu todo o mau humor. "’Grande sertão veredas’ é o maior livro já escrito", respondeu.

A partir do gatilho, a conversa dos dois sobre Guimarães Rosa se estendeu até as 5 horas da manhã no terraço do Othon.