O legado que a COP30 cobrará
As COPs são reuniões anuais organizadas pela ONU (Organização das Nações Unidas) que reúnem quase 200 países para negociar ações globais contra a crise climática. É nesse espaço que governos, empresas, instituições financeiras, academia e sociedade civil assumem compromissos que impactam economias inteiras, desde metas de redução de emissões até investimentos internacionais em energia, infraestrutura, conservação e adaptação.
Não se trata apenas de um encontro diplomático, mas de um ambiente onde se formam consensos, se revelam disputas e se mede, na prática, o quanto cada liderança está disposta a agir diante da emergência climática.
Nas últimas COPs, a comunidade internacional firmou a meta de limitar o aquecimento do planeta a 1,5°C. Mas o mundo já ultrapassou esse limiar. Secas prolongadas, enchentes devastadoras, incêndios e perdas agrícolas confirmam que a crise climática deixou de ser previsão e passou a ser realidade.
É nesse contexto que chegamos à COP30, com o Brasil sediando o encontro em Belém, no Pará. A escolha da cidade é simbólica: coloca a Amazônia, maior floresta tropical do planeta e peça-chave no equilíbrio climático, no centro das negociações. E também coloca o país diante de uma oportunidade histórica de liderar a construção de um pacto que combine desenvolvimento econômico, justiça social e preservação ambiental.
Ao discursar na Cúpula dos Líderes sobre o Clima, na abertura da conferência, na capital paraense, o presidente Lula falou em legado. Disse que é hora de levar a sério os alertas da ciência, defendeu ações concretas e reconheceu a força de grupos econômicos que buscam relativizar ou desacreditar a crise ambiental.
Hoje, o negacionismo explícito é menos frequente. O que vemos crescer é uma narrativa que disfarça a negação da ciência sob o argumento de defesa do progresso, enfraquecendo a construção de um projeto nacional competitivo que não destrua sua própria base natural.
Nesse cenário, a discussão sobre reputação se torna central. Em um mundo hiperconectado, reputação não se constrói no discurso, mas na coerência entre o que se promete e o que se entrega. A credibilidade de governos e empresas será medida pela consistência das suas ações, pela robustez das metas assumidas, pela transparência das métricas utilizadas e pela capacidade de demonstrar resultados verificáveis. Sem isso, qualquer anúncio corre o risco de ser percebido como greenwashing, uma camada frágil de narrativa que se desfaz no primeiro confronto com a realidade.
Nos últimos anos, não foram poucas as empresas que recuaram em compromissos ambientais e sociais sob pressão de acionistas conservadores ou movimentos ideológicos. Foi notória a retração das agendas de diversidade, equidade e sustentabilidade em grandes corporações internacionais. Esse retrocesso não é apenas ajustamento estratégico. É um enfraquecimento de confiança.
Quando instituições falam mais do que fazem, perdem legitimidade perante consumidores, investidores, comunidades e parceiros. E reputação perdida cobra preço alto: reduz competitividade, desgasta relacionamentos e limita a capacidade de diálogo com a própria sociedade que se pretende influenciar.
A crise climática exige novas formas de liderar. Liderar, hoje, significa educar, engajar e transformar. Significa reformular modelos de negócio, reduzir impactos ambientais de forma mensurável e agir de modo transparente e responsável.
Os líderes que se destacarão na era da urgência climática são aqueles capazes de imaginar o futuro que querem construir e agir de maneira consequente desde agora. Não há espaço para retórica vazia ou para adiamentos estratégicos em nome de conveniências momentâneas. O tempo da hesitação passou.
A COP30 cobrará menos o que o Brasil diz e mais o que o Brasil faz. Cobrará das empresas não a campanha publicitária, mas a entrega real. Cobrará das lideranças não o discurso, mas a coragem. Porque o legado não é declarado. É construído. E, ao final, a COP30 não perguntará apenas qual posição assumimos no plenário. Perguntará algo mais profundo e definitivo: que mundo decidimos deixar.
Patrícia Marins é gestora de crises de alto risco reputacional , sócia-fundadora da Oficina Consultoria e do WOB – Women on Board, Conselheira do MeToo Brasil e coautora do livro “Muito além do Media training – O porta- voz na era da hiperconexão”
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