Empresas tradicionais e plataformas de tecnologia adicionaram mais um capítulo a uma disputa pelo futuro do transporte rodoviário interestadual no Brasil. A mais recente ofensiva veio da Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati), que acusa a FlixBus de adotar no país um discurso pró-concorrência enquanto, na Europa, teria se consolidado como operadora dominante do setor.
A Abrati baseia sua crítica em um levantamento do escritório alemão Gleiss Lutz, segundo o qual a FlixBus atingiu mais de 90% do mercado de ônibus de longa distância na Alemanha após a liberalização do setor e sucessivas aquisições. O estudo aponta que a concentração teria sido seguida por aumento de preços, redução de rotas e crescimento nas reclamações de passageiros. Para a entidade, esse histórico contradiz o discurso da empresa no Brasil.
“A mesma empresa que, no Brasil, propaga um discurso de abertura econômica e livre concorrência, na Europa é apontada como promotora de uma estrutura concentrada de monopólio”, afirmou à coluna o presidente da Abrati, Paulo Porto Lima.
A disputa também envolve a forma de atuação da FlixBus no país. A empresa oferece serviços tecnológicos a transportadoras autorizadas e, paralelamente, obteve autorização da ANTT para operar diretamente suas próprias rotas, previstas para iniciar em meados de dezembro.
A Abrati afirma que o modelo de prestação de serviços funcionaria como operação indireta e geraria risco concorrencial. Internamente, a FlixBus entende que o arranjo consiste apenas em oferta de tecnologia e suporte operacional, sem controle sobre as empresas contratantes.
A discussão avança enquanto a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) revisa o marco regulatório do setor.
A coluna procurou a FlixBus, mas a empresa preferiu não se manifestar individualmente e respondeu que o posicionamento seria dado pela Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que reúne plataformas como FlixBus, 99, Amazon, Buser, iFood e Uber.
Em nota à coluna, a Amobitec criticou as comparações entre os mercados brasileiro e europeu. A associação destacou que são realidades distintas e que experiências internacionais apontam para aumento de oferta, expansão de cobertura e maior eficiência após a abertura. Disse ainda que modelos liberalizados operam sem barreiras de entrada e que suspeitas sobre uso indevido de dados “não se sustentam”, uma vez que plataformas seguem regras claras e fiscalizáveis.
