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O pré-carnaval conflagrado dos 45 anos do PT

Em festa no Rio de Janeiro, o partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva celebra quatro décadas e meia de existência com novas e antigas divergências

Arte: Daniel Medeiros/PlatôBR
Arte: Daniel Medeiros/PlatôBR

Uma grande festa ocorrerá neste fim de semana no Pier Mauá, na região portuária do Rio de Janeiro. Vai ter roda de samba com Pretinho da Serrinha, Teresa Cristina e Roberta Sá. Vai ter também o Samba do Trabalhador, com Moacyr Luz, e Dudu Nobre, além de apresentações das baterias da Mangueira, da Grande Rio e da União de Maricá, escola montada pelo deputado federal Washington Quaquá, em 2015, quando era prefeito da cidade da Região do Lagos. Uma programação cultural de fazer inveja a muito carnaval Brasil afora.

Tudo isso para comemorar os 45 anos de fundação do Partido dos Trabalhadores. O clima, no entanto, está mais para guerra do que para folia. A sigla do presidente Luiz Inácio Lula da Silva faz aniversário no poder e tem de lidar com problemas decorrentes dessa condição. São assombros com a baixa popularidade de Lula, sua estrela maior, divergências com a política econômica implementada pelo governo de base ampla, disputas internas por cargos e remunerações. No meio disso tudo, torna-se mais evidente a constatação de que, quatro décadas e meia depois de criado, o partido ainda não dispõe de alternativas ao nome de Lula, com 79 anos, para corrida eleitoral de 2026.

Guerra interna
O PT está conflagrado por cargos de direção. No início desta semana, a disputa ficou mais explícita. A presidente do partido, Gleisi Hoffmann, defende a permanência da atual tesoureira, Gleide Andrade, e conseguiu aprovar na reunião do Diretório Nacional uma mudança no estatuto do partido que acaba com a proibição de permanência de um dirigente nas instâncias partidárias por mais de três mandatos consecutivos. No grupo do partido, a proposta por Gleisi chegou a ser chamada de "emenda Gleide" por petistas que identificaram sua motivação.

O problema é que essa regra foi definida no 4º Congresso do PT, em 2012, e por isso só poderia ser modificada em um novo congresso. Com esse argumento, alguns membros do partido, insatisfeitos, ameaçam recorrer à Justiça para anular a decisão aprovada com 60 votos a favor, 27 contrários e 5 abstenções. Detalhe: o salário de um dirigente nacional do PT equivale à remuneração de um deputado federal, R$ 46.366,19.

A alteração no estatuto acabou se tornando um ponto de discussão no processo de eleição direta no partido, conhecido pela sigla PED, que terá que o sucessor de Gleisi na presidência. Virou um assunto eleitoral interno. O dirigente da Articulação de Esquerda, Valter Pomar, por exemplo, disse que não pretende entrar na Justiça, mas que a corrente deve fazer seu congresso em março com o objetivo de lançar chapa e candidatura nacionais, alternativa ao nome colocado por Lula, o do ex-ministro e ex-prefeito de Araraquara Edinho Silva. "Sobre entrar na justiça, claro que não. Nossa resposta a mais este atropelo será ganhar o PED", disse ao PlatôBR.

Lula continua dando as cartas na presidência do PT e sabe que a reforma que pretende fazer em seus ministérios tem potencial de calar as críticas a seu apoio a Edinho. Segundo petistas do Planalto, o presidente pretende anunciar no sábado, 22, o nome de Gleisi como ministra da Secretaria-Geral da Presidência. Essa será uma forma de tentar suplantar as divergências. Gleisi também tinha intenção de construir uma candidatura alternativa à de Edinho, no entanto, ela poderia desistir desse movimento se Edinho aceitasse manter Gleide Andrade, a aliada de Gleisi, na tesouraria. Esse é só um exemplo de interferência das decisões de Lula sobre o partido.

Outro aspecto da reforma tem consequência nas acomodações internas: para contemplar mais cargos para Centrão na Esplanada, o PT terá de perder espaço. Nesse quesito, outra insatisfação recai sobre o ministro Alexandre Padilha. Setores do partido se ressentem de terem sido preteridos na Esplanada dos Ministérios de Lula muito em função da articulação política feita por ele nos dois primeiros anos. Rivais de Padilha no PT apontam que ele deixou o governo refém do Centrão. Sem Padilha, reclamam, não existiria União Brasil no governo, por exemplo. A intenção de Lula de levá-lo para o Ministério da Saúde é vista por essas pessoas como um prêmio depois de uma condução "desastrosa" da articulação feita por Padilha.

Juros e ajuste fiscal
Não é de hoje que as críticas de integrantes do PT à política econômica desenvolvida por Fernando Haddad no governo são feitas em público. Neste governo, por exemplo, Gleisi Hoffmann e os setores mais à esquerda se levantam contra cortes de despesas nos ajustes fiscais e contra a taxa de juros do Banco Central. No final de janeiro, em conversa com jornalistas no Planalto, o próprio Lula saiu em defesa da presidente do partido. "O pessoal fala: ‘Ah, mas ela é muito radical para ser presidente do PT’. Ora, para ser presidente do PT, ela tem que falar a linguagem do PT. Se ela não (agisse) assim, que ela fosse para o PSDB”, disse o presidente.

Apesar da contemporização de Lula, as divergências internas continuam evidentes. Esses embates, sobre economia ou outros temas, diga-se, são comuns e fazem parte nos 45 anos de história da sigla. Apenas mudam, ao longo do tempo, os motivos das trombadas entre os dirigentes e as correntes. Nesse campo minado, o presidente tentará somar na festa um ponto positivo em sua relação com o partido, pedindo licença para levar Gleisi para o governo.

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