A prisão de Fernando Collor de Mello traz algumas mensagens do STF sobre o futuro de Jair Bolsonaro. A leitura mais imediata seria que, se o tribunal teve coragem para prender um ex-presidente, poderá fazer isso com o outro em breve. Entretanto, diferenças jurídicas e políticas entre os dois casos impedem que se chegue diretamente a essa conclusão.

A primeira diferença é o estágio dos processos abertos contra cada um dos ex-presidentes. Collor foi denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) em agosto de 2015 em decorrência da Operação Lava Jato. Foi condenado pelo STF em maio 2023. A maioria dos ministros concordou que havia provas suficientes para enquadrá-lo nas práticas de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

A prisão foi decretada apenas dois anos depois da condenação porque, no STF, a jurisprudência determina que o réu inicie o cumprimento da pena após o trânsito em julgado do processo - ou seja, quando o tribunal terminar de julgar todos os recursos que a defesa tem direito de apresentar. Isso só aconteceu na semana passada.

Portanto, se Bolsonaro for condenado por tentativa de golpe de Estado, o mais provável é que ele aguarde em liberdade o julgamento dos recursos. A prisão viria após o trânsito em julgado. A exceção seria para a necessidade de prisão preventiva. Entre os motivos para isso acontecer, estaria uma eventual tentativa de fuga para evitar o cumprimento da pena.

O processo de Bolsonaro foi aberto há pouco mais de um mês. Ele foi notificado disso na semana passada. As investigações que alimentarão a ação penal ainda não começaram. A expectativa no STF é que a ação penal seja julgada no segundo semestre. Depois disso, se houver condenação, será aberto prazo para recursos.

Outra diferença entre os processos contra os dois ex-presidentes são os crimes imputados a eles. Collor foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Bolsonaro responde a cinco crimes, sendo o principal deles tentativa de golpe de Estado.

Quando Collor foi condenado, o STF já tinha adquirido experiência, com o processo do mensalão, o julgamento de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. No caso de Bolsonaro, será a primeira vez que o tribunal julgará uma ex-autoridade por tentar dar um golpe. Não há parâmetros fixados pelo Supremo nesse tipo de discussão. Portanto, não será uma decisão fácil de se tomar.

O ambiente político dos julgamentos também influencia na tomada de decisões do STF. Quando Collor foi julgado, não houve apelo da classe política no sentido de absolvê-lo. Hoje, enquanto as ações sobre a tentativa de golpe tramitam no Supremo, o Congresso Nacional discute a concessão de anistia aos acusados ou, alternativamente, a mudança da legislação para reduzir as penas dos condenados.

Há mais uma questão a ser analisada. Collor foi absolvido pelo STF em outros processos, em 1994 e em 2014. Naquela época, mesmo tendo sido defenestrado do Palácio do Planalto, Collor ainda contava com alguma popularidade. Ocupou uma cadeira no Senado entre fevereiro de 2015 e janeiro de 2023.

Depois disso, veio o ocaso na política: não foi eleito em 2022 e está fora dos holofotes. O STF, portanto, teve mais dificuldade em condenar Collor quando ele ainda gozava de algum prestígio entre os eleitores. Hoje, prender Fernando Collor não provoca qualquer tipo de atrito com os outros Poderes ou a sociedade.

Nesse aspecto, Bolsonaro leva vantagem: com milhares de eleitores e aliados importantes em posição de poder, a prisão do ex-presidente acarretaria ônus político relevante ao STF. Daí o excesso de zelo da Corte ao cogitar até mesmo a prisão preventiva.

Em várias ocasiões, Bolsonaro xingou ministros do Supremo. Conclamou as pessoas a descumprirem decisões tomadas pela Corte. Em 2024, hospedou-se na Embaixada da Hungria. Nessas situações, o STF não viu elementos concretos que justificassem prisão preventiva por ameaça à ordem pública ou tentativa de fuga.