Presidente da Federação Bahiana de Futebol (FBF) desde 2019, Ricardo Lima (à direita, na foto acima) tem em seus contracheques um exemplo cristalino de como o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, turbinou os salários de dirigentes estatuais — os apoiadores mais valiosos que um cartola em sua posição pode querer, por serem eles, mais do que os clubes, quem define o chefe da entidade máxima do futebol brasileiro.

O repórter Allan de Abreu detalhou como Ednaldo costurou, contando com muito dinheiro em agrados e favores, a vasta rede de apoios na cartolagem que o levou a uma reeleição por unanimidade em março passado. Ele ficará no comando da CBF ao menos até 2030.

A coluna teve acesso a documentos internos da CBF que mostram como explodiram os ganhos de Ricardo Lima junto à entidade entre 2021, quando Ednaldo assumiu o cargo, e 2024: de R$ 860 mil para R$ 3,6 milhões, um salto de 318%.

No caso do cartola baiano, homem de confiança de Ednaldo, sucessor dele na federação da Bahia e um dos atuais vice-presidentes da CBF, as relações são também familiares. Os dois são cunhados.

Os documentos a que a coluna teve acesso indicam que, ao longo de 2021, Ricardo Lima recebeu da CBF, enquanto presidente da FBF, R$ 860 mil brutos. Compuseram o valor R$ 470 mil em “honorários” e R$ 390 mil em uma rubrica definida apenas como “PGTO AUTONOMO”, ou seja, pagamentos autônomos. A CBF não quis explicar à coluna o que são exatamente esses pagamentos.

Entre janeiro e junho de 2021, os honorários pagos pela CBF a Ricardo Lima haviam sido de R$ 20 mil mensais. Ednaldo Rodrigues, então um dos vice-presidentes da CBF, assumiu a presidência interinamente em agosto, no lugar de Rogério Caboclo. De julho a setembro, a remuneração de Lima passou a R$ 50 mil. Em outubro, R$ 70 mil em honorários mais R$ 90 mil em “pagamentos autônomos”, R$ 160 mil ao todo. Em novembro, um total de R$ 195 mil no total e, em dezembro, R$ 215 mil.

Em 2024, já com Ednaldo havia três anos no comando da CBF, os ganhos do presidente da federação baiana atingiram outro patamar: R$ 3,6 milhões brutos, dos quais recebeu R$ 2,3 milhões líquidos.

Naquele ano, o total em honorários do presidente da FBF foi de R$ 2,1 milhões, uma média de R$ 175 mil por mês, com valores variando de R$ 77 mil a R$ 194,7 mil. Em 2024, Lima também recebeu mais R$ 1,5 milhão por meio dos tais “pagamentos autônomos” — R$ 33 mil no menor valor, em janeiro, e R$ 286 mil no maior, em fevereiro.

Somando os honorários e os outros pagamentos destinados a Ricardo Lima, os proventos da CBF a ele, em valores brutos, chegaram a R$ 488 mil em fevereiro de 2024, R$ 408 mil em abril, R$ 402 mil em maio, R$ 325,6 mil em novembro e R$ 323,9 mil em dezembro.

A coluna procurou a CBF para ouvi-la sobre os pagamentos milionários a Ricardo Lima. Entre as indagações, perguntou o que seriam os “pagamentos autônomos” que constam nos documentos.

A CBF optou por não responder as questões e enviou uma nota. Disse a confederação:

“Todo e qualquer pagamento feito pela instituição na gestão do presidente Ednaldo Rodrigues é feito de acordo com o estatuto, apresentado à auditoria interna e externa e submetido ao controle do Conselho fiscal e da assembleia geral. Não se paga um centavo em desacordo com o estatuto. Nunca houve tanto controle e transparência na gestão”.

“Repudia-se categórica e veementemente qualquer tipo de alegação falaciosa, leviana e arranjada de pagamentos feitos em desacordo com o estatuto ou com qualquer finalidade que não seja lícita e estatutária. E lamenta-se, profundamente, que vozes de mau agouro pretendam, em vão, de forma tola e até pueril, desestabilizar uma gestão que, eleita de forma histórica, já tem alcançando os melhores números na gestão da entidade”.

A coluna tentou contato com Ricardo Lima e a FBF por meio de ligações, mensagens e e-mail, mas não teve retorno até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto a manifestações.

Família, confiança e espionagem

A reportagem da revista piauí, publicada em abril, mostrou o nível de confiança entre Ednaldo Rodrigues e Ricardo Lima, os cunhados. O atual presidente da FBF foi vice de Ednaldo na federação baiana e o sucedeu no cargo em janeiro de 2019. Em março de 2025, foi eleito para uma das vice-presidências da CBF, cargo que acumula com a chefia do futebol na Bahia.

No início de 2023, ao contratar uma vistoria no sistema anti-incêndio da CBF, a arquiteta Luísa Xavier da Silveira Rosa, então diretora de patrimônio da entidade, encontrou uma câmera com captação de áudio escondida sob um detector de fumaça no restaurante do prédio.

Investigando o caso, ela soube que as imagens e áudios eram guardados em uma central, que ficava em uma sala contígua ao gabinete de Ednaldo Rodrigues — e à qual só ele tinha acesso.

Rosa também descobriu uma conversa de WhatsApp entre Ricardo Lima e um funcionário do setor de tecnologia da informação da CBF. Na conversa, o funcionário perguntou a Lima: “Câmeras escondidas no restaurante. Envia para o setor de compras? Boa tarde!”. Ricardo Lima, então, respondeu: “Boa tarde! Perfeito. Envia, sim”.