Relator do processo do mensalão e ex-presidente do STF, o ministro aposentado Joaquim Barbosa critica a decisão da corte de julgar os processos sobre a tentativa de golpe na Primeira Turma, composta de cinco ministros. Para ele, o caso é relevante demais para não ser analisado pelos onze integrantes do tribunal no plenário principal.
“Pelo ineditismo e pela magnitude do caso, seria mais apropriado que esse julgamento ocorresse no plenário”, disse o ministro à coluna.
Barbosa não é o único contrário à realização do julgamento em um colegiado menor. Em caráter reservado, um ministro do Supremo afirmou, também à coluna, que o ideal seria o debate em plenário. Ele ponderou, no entanto, que o Regimento Interno do tribunal estabelece as turmas como foro para julgamento de processos penais - e, portanto, não haveria como levar os processos ao plenário agora.
Integram a Primeira Turma os ministros Alexandre de Moraes, relator das investigações, Luiz Fux, Cristiano Zanin, Flávio Dino e Cármen Lúcia. O colegiado tem perfil punitivista. Na avaliação dos próprios integrantes do tribunal, a tendência é que as denúncias sejam recebidas e, ao final do processo, os principais réus sejam condenados.
Os ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, indicados ao STF pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, não participarão do julgamento porque são membros da Segunda Turma. Se o julgamento fosse em plenário, eles participariam da votação. Em julgamentos anteriores sobre o mesmo tema, quando as ações penais ainda eram analisadas em plenário, os dois apresentaram votos divergentes do relator.
Mensalão
A denúncia contra 40 indiciados no caso do mensalão, que desvendou um esquema ilícito de compra de apoio político ocorrido no primeiro governo Lula, chegou ao STF em 2006. Em 2007 o plenário aceitou transformá-la em ação penal.
Para agilizar a tramitação, Joaquim Barbosa propôs a divisão do processo, deixando no STF apenas autoridades com prerrogativa de foro. A ideia foi rejeitada em plenário, com o argumento de que os crimes tinham relação próxima e não seria produtivo separar as investigações. O julgamento final dos réus ocorreu apenas em 2012.
Para o ministro aposentado, o plano da PGR de dividir a denúncia contra os investigados por tentativa de golpe em grupos pode agilizar a tramitação dos processos, com possibilidade de julgamento dos principais réus ainda no fim deste ano.
“Tudo ali (no processo do mensalão) era inédito. O tribunal não tinha ainda experiência em julgar casos criminais tão abundantes e tão complexos naquela época. Se fatiarem, e dependendo da dimensão de cada bloco de fatiamento, é plausível terminar neste ano o julgamento”, opinou o ministro aposentado.
'Tecnologia ajuda'
Barbosa acrescentou que a tecnologia disponível hoje contribui para acelerar a tramitação dos processos. O caso do mensalão chegou ao tribunal em papel e os autos eram acomodados em uma sala-cofre do tribunal. Após alguns anos de tramitação, os documentos passaram a ser digitalizados.
“Hoje tem um fator que ajuda muito, que é a tecnologia. O caso do mensalão, quando chegou ao STF, era todo em papel e preenchia uma sala inteira do anexo 2”, lembra.
Como o PlatôBR publicou no último sábado, 8, a PGR planeja fatiar as denúncias contra suspeitos de idealizarem uma tentativa de golpe de Estado. Os 40 indiciados no relatório da Polícia Federal - coincidentemente, número igual ao do mensalão - devem ser alvo de acusações de forma individualizada.
A denúncia contra Jair Bolsonaro deve ser incluída na primeira leva. A expectativa é que as denúncias comecem a ser enviadas ao tribunal ainda neste mês.
A medida foi pensada para dar mais agilidade à tramitação dos processos e possibilitar que o julgamento final dos acusados considerados peças-chave no caso seja realizado o mais breve possível. Dessa forma, o julgamento de Bolsonaro e seu entorno aconteceria antes de iniciada a campanha eleitoral de 2026, ano de eleições para o Congresso e para a Presidência.
Na visão de ministros da corte e de integrantes da PGR, acrescentar o elemento da disputa eleitoral em meio ao julgamento tumultuaria ainda mais o cenário político e ampliaria os ataques ao tribunal.