O segundo semestre do Congresso começa esta semana sob o impacto de dois fatos que agitaram o recesso: as medidas restritivas impostas pelo STF ao ex-presidente Jair Bolsonaro e o tarifaço aplicado pelo governo Donald Trump ao Brasil. Com essas novidades, o Legislativo retoma os trabalhos em clima de acirramento da polarização política entre o governo e a oposição. A perspectiva de julgamento do ex-presidente em setembro pelo STF aumenta a temperatura política em Brasília.
As próximas semanas também vão testar também a relação entre Lula e a cúpula do Senado e da Câmara. Até meados de julho, prevalecia um clima de tensão entre o Planalto e os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Neste domingo, 3, em discurso feito no encontro do PT, Lula antecipou um dos assuntos que vão medir as forças do governo e do Congresso: o veto integral à proposta que amplia o número de deputados federais de 513 para 531, aprovado nas duas Casas.
“Alguns não queriam que eu vetasse o aumento de deputados na Câmara. Eu vetei porque não é disso que o Brasil está precisando, gente”, disse o petista. “Eu vetei e o Congresso tem direito de derrubar o meu veto. Vamos ver o que que vai acontecer”, acrescentou. A proposta era prioridade de Motta e foi vetada por Lula no último dia antes do recesso. A depender de Alcolumbre, o caso será levado ao plenário na próxima sessão conjunta.
Abaixo, outros assuntos que vão ocupar a pauta do Congresso no segundo semestre.
CPI do INSS
Um ponto que poderá causar tensão é a CPI Mista do INSS, criada para investigar os descontos indevidos nas contas dos aposentados em favor de entidades. O governo conseguiu empurrar o funcionamento para agosto e, nesse meio tempo, iniciar a devolução do dinheiro descontado.
O Planalto também conseguiu articular o nome de um aliado para presidir o colegiado. Trata-se do senador Omar Aziz (PSD-AM). Mas está nas mãos de Motta a tarefa de indicar um relator. O PL pressiona para um nome da direita, Motta sinalizou que deve ser um nome do Centrão.
Pacote anti-tarifaço
As pendências do primeiro semestre, no entanto, acabam atravessadas agora por um novo contexto. Com a imposição da sobretaxa de 50% sobre exportações brasileiras para os Estados Unidos, o governo prepara um pacote de medidas de contingência que dependerá do aval do Congresso.
Esse pacote está sendo fechado pela equipe econômica e deve ser anunciado nesta semana. A entrada em vigor das taxas aplicadas pelo governo Trump está prevista para quarta-feira, 6. Existe a expectativa de que o pacote anti-tarifaço funcione como um ponto de aglutinação do governo com a cúpula do Congresso.
Cassações
A reboque do tarifaço, está também no radar de Motta, o tratamento a ser dado ao mandato de Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que se licenciou do mandato para articular, nos Estados Unidos, os ataques à ao STF e as sanções que afetam a economia brasileira e o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), relator do processo que levará a julgamento o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ), réu por tentativa de golpe de Estado. Nessa pauta, PL e PT pressionam Motta em sentidos contrários.
Da mesma forma, os dois partidos também tentam influenciar o presidente da Câmara na decisão sobre o processo de cassação do mandato da deputada Carla Zambelli (PL-SP), condenada a 10 anos de prisão pela invasão ao sistema eletrônico do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
Outro processo de cassação que pode ser votado neste semestre é contra o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), acusado de quebra de decoro por expulsar da Câmara, aos pontapés, um militante que o provocava. O parlamentar chegou a fazer greve de fome para tentar barrar o pedido, já foi aprovado pelo Conselho de Ética. Agora, o caso depende de decisão do plenário.
Pauta da oposição
As articulações de Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos e o tarifaço imposto por Trump esquentaram ainda mais os ânimos no Congresso e levaram a oposição a priorizar dois temas para esse segundo semestre. Um deles é o projeto de lei que anistia os condenados pela tentativa de golpe de Estado. Motta resiste a colocá-lo na pauta.
Outro assunto são medidas que limitam as ações do STF, como o projeto que reduz o alcance das decisões monocráticas de ministros e o que restringe os partidos que podem questionar no Supremo as decisões do Legislativo. Alcolumbre apoia essa redução, mas ainda há dúvidas se ele pautará a matéria em um ambiente tão conflagrado pelas imposições de Trump.
Imposto de Renda
Além dos assuntos de disputa política, as prioridades do governo ainda aguardam decisão do Congresso. A isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil é uma delas. O parecer do relator Arthur Lira (PP-AL) foi aprovado em julho em comissão especial e está pronto para ir ao plenário. Além da isenção do imposto para quem ganha até R$ 5 mil mensais, o texto reduz parcialmente a tributação para a faixa que recebe de R$ 5 mil a R$ 7.350,00, segundo o relatório de Lira.
Para compensar a perda de arrecadação, o projeto prevê a cobrança de uma alíquota extra progressiva de até 10% para quem ganha acima de R$ 600 mil por ano, ou R$ 50 mil por mês. A alíquota máxima, de 10%, passará a ser cobrada das pessoas que ganham a partir de R$ 1,2 milhão por ano. O relatório de Lira propõe mudanças nessas compensações.
Haddad e Bets
Outra proposta de interesse do Planalto é a que prevê o aumento da taxação das empresas de apostas on-line, as chamadas bets. De acordo com a ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), junto com a reforma do IR, essa é uma das votações importantes para o governo nesse segundo semestre.
A MP 1.303/2025 prevê também prevê a tributação de títulos de investimentos hoje isentos, como a LCA (Letra de Crédito Agropecuário). “Não é possível que os muito ricos não paguem imposto neste país, e que o imposto recaia sobre a classe trabalhadora. Nós temos que taxar bancos, bilionários e as bets. Essa gente não pode continuar ganhando dinheiro e não contribuindo com a riqueza do Brasil”, afirmou a ministra, ao participar do encontro do PT.
Ainda na pauta econômica, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) é esperado na quarta-feira, 6, para falar sobre essa proposta na comissão mista criada para analisar o tema.
LDO
Outra pendência é a votação do projeto de Lei das Diretrizes Orçamentárias (LDO), que orienta a elaboração do Orçamento. Ele chegou ao Parlamento em abril e deveria ter sido enviado à sanção presidencial há duas semanas, em 17 de julho, conforme prevê a Constituição. Mas a proposta passou quase dois meses parada, sem relatoria definida na Comissão Mista de Orçamento (CMO). Indicado pelo PT para ocupar o posto, o deputado Carlos Zarattini (SP) foi substituído na vaga pelo deputado Gervásio Maia (PSB-PB), que só em julho apresentou seu relatório preliminar, aprovado pela CMO.
O presidente da comissão, senador Efraim Filho (União-PB), sugeriu novo calendário para a tramitação da matéria. Com isso, senadores e deputados têm o período de 5 a 14 de agosto para oferecer emendas ao projeto de lei. Depois disso, o relator apresentará seu parecer que precisa passar pela CMO e pelo plenário do Congresso. O líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), indicou que as duas votações devem ocorrer em agosto.