Por ter amargado um desgaste significativo nas redes sociais pela indicação do deputado Guilherme Derrite (PP-SP) para relatar o projeto de lei contra facções, o presidente da Câmara estava ansioso para virar a página. Nesta quarta-feira, 12, porém, pedidos de adiamento chegaram a Motta vindos de vários atores políticos: Planalto, governadores de oposição, além de líderes como Sóstenes Cavalcante (RJ), do PL, José Guimarães (CE), do governo, e Isnaldo Bulhões (AL), do MDB. Todos procuraram o presidente da Câmara com a intenção de arrastar a discussão até a próxima semana.
Mas a quem interessa o adiamento? Aos que querem a polarização. Do lado da oposição, a pauta clássica da direita permitiu uma retomada do discurso da segurança pública e, assim, recobrar forças depois da corrosão de imagem sofrida com o tarifaço contra o Brasil combinado por aliados de Jair Bolsonaro com o governo Trump e, também, com a rejeição da “PEC da Blindagem”.
Pelo lado do governo, auxiliares do Planalto avaliam que o desgaste sofrido por Lula desde a megaoperação policial no Rio de Janeiro foi menor do que as previsões internas apontavam. Pesquisa Genial/Quaest divulgada nesta quarta apontou que o trabalho do governo é avaliado negativamente por 34% da população. Em relação a março deste ano, houve uma queda de quatro pontos percentuais.
Os que consideram a atuação de Lula regular na questão da segurança pública subiram de 32% para 36% desde março; o índice dos brasileiros que avaliam positivamente o governo oscilou dentro da margem de erro, de 25% em março para 26% agora. Na prática, as oscilações mostraram pouco impacto até agora para o governo, embora esse seja um tema incômodo para a esquerda.
Entre aliados de Lula, há uma ideia de que o governo acertou o tom na resposta após a operação contra o Comando Vermelho, no Rio de Janeiro, que se tornou a mais letal da história, com 121 mortos, ao enfatizar a importância da PEC da Segurança, apresentar o “PL Antifacção” e, por último, obter sucessivas alterações no texto do relator. Por essa avaliação, o debate da legislação é uma oportunidade para a esquerda mostrar suas propostas nessa área e tentar reverter pelo menos um pouco a percepção de que os governos petistas falham no combate à criminalidade.
O Planalto tenta usar os recuos de Derrite para caracterizá-lo como um parlamentar com pouca capacidade legislativa. Até a semana passada, o deputado era secretário de Segurança Pública no governo de Tarcísio de Freitas, possível adversário de Lula nas eleições do próximo ano. Os governistas também buscam marcar posição na defesa dos pontos que constavam no “PL Antifacção” original, apresentado pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski.
Outro aspecto a ser considerado pelo governo é que a oposição ainda pode aprovar no plenário algum destaque que desfigure o texto acordado entre os líderes e, por exemplo, restitua a proposta de equiparar as facções a organizações terroristas.
Ampla exposição
Para Derrite, cada negociação é uma oportunidade para desfazer um pouco a imagem de truculência adquirida no tempo que era policial em São Paulo. Na função de relator, ele se coloca como um parlamentar em busca de entendimento, ora com o governo, ora com a oposição, mas em busca de um projeto que possa ser considerado fruto de um amplo acordo na Câmara. É também uma forma de o deputado ficar conhecido nacionalmente e fortalecer sua capacidade eleitoral no estado. Ele deve tentar uma vaga no Senado no ano que vem.
Nesta quarta, uma sessão solene no Senado organizada pela oposição serviu para potencializar a fama de Derrite nesses dias de ampla exposição no Congresso e na mídia. Formalmente, a sessão pedida pelo senador Ciro Nogueira (PP-AL) era uma homenagem às forças que atuaram na operação contra o Comando Vermelho. Mas a cerimônia se transformou em uma celebração da direita.
Por lá passaram senadores e deputados bolsonaristas, além dos govenadores do Rio, Cláudio Castro (PL), de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo) e de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil). Depois, os chefes dos executivos estaduais se encontraram com Motta para pedir o adiamento da votação e pressionar por um relatório que aumente o rigor das penas. Na cerimônia, Derrite se comportou como um anfitrião, sendo saudado na maioria dos discursos e se colocando próximo da tribuna enquanto os oradores ocupavam o microfone.
