O réus dos processos do STF (Supremo Tribunal Federal) contra a trama golpista negaram nesta quinta-feira, 24, envolvimento nos crimes narrados nas denúncias da Procuradoria-Geral da República e focaram suas defesas no ataque à provas e interpretações das investigações que eles dizem ser equivocadas.

Foram interrogados 13 réus de dois processos penais abertos por Alexandre de Moraes no STF. Ouvidos simultaneamente em duas audiências virtuais, por teleconferência, a maioria atacou pontos cegos e possíveis falhas de procedimentos no trabalho da Polícia Federal. Negaram crimes, mas admitiram pontos cruciais para a PGR, como a autoria do documento que seria o plano para sequestrar e até matar autoridades, entre eles o próprio Moraes.

A estratégia, segundo apurou o PlatôBR, busca desqualificar e enfraquecer elementos e dados usados como provas em episódios importantes da narrativa da trama golpista da PGR. O objetivo é minar a solidez dessas provas que sustentam os crimes imputados a eles. Os denunciados foram acusados por cinco tipos de crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

A PGR dividiu os 34 réus da trama golpista em quatro núcleos, cada um alvo de uma ação penal no STF. Jair Bolsonaro foi interrogado em 10 de junho, junto com outros sete réus que integram o núcleo 1 – primeiro que será julgado por Moraes, ainda este ano. O grupo considerado “crucial” nas denúncias tem ainda o general Walter Braga Netto e o ex-diretor da Abin e deputado federal Alexandre Ramagem (PL-SP).

Nesta quinta-feira foram ouvidos seis réus do núcleo 2 (que teriam coordenado as ações estratégicas da trama) e sete do núcleo 4 (propagadores de desinformação e notícias falsas). Os dez acusados do núcleo 3 (executores dos planos violentos) serão interrogados na segunda-feira, 28.

Nas mais de dez horas de interrogatórios, teve súplica e choro de réu ao negar os crimes, advertência do juiz auxiliar do gabinete de Moraes para os réus e advogados e negativa dos planos de espionagem e atentados. Para investigadores ouvidos em reservado, alguns dos réus entraram em contradição com as provas reunidas e até fizeram confissões parciais. Como o general do Exército da reserva Mário Fernandes, que trabalhava no Planalto e admitiu ter redigido o plano que previa monitorar e atacar as autoridades. Ele negou, porém, ter usado ou colocado em prática o plano.

Foram quatro os principais pontos atacados pela maioria dos réus: 1) a interpretação da PF de conversas via aplicativos recuperadas dos celulares dos investigados; 2) o rascunho encontrado pela PF do decreto de intervenção, chamado de “minuta do golpe”; 3) a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-braço direito de Bolsonaro no Planalto; e 4) a reunião no Palácio da Alvorada, com o então ministro Braga Netto, comandantes das Forças Armadas e assessores de Bolsonaro, em que teria sido selado o apoio armado aos planos.

A delegada Marilia Ferreira de Alencar, ex-diretora de Inteligência da PF, atacou um desses “pontos cegos” das investigações explorados pelas defesas e que ainda serão analisados por Moraes no julgamento. As conversas entre os acusados encontradas em celulares apreendidos que foram usadas nos relatórios de indiciamento e que sustentam episódios importantes da trama.

“Me espantei. Como delegada nunca vi um analista colocar no relatório de análise que as mensagens apagadas foram recuperadas pelo Cellebrite e reorganizadas aferindo o que foi apontado. Aferir é deduzir. A interpretação foi feita com base no entendimento do analista, não com base científica ou em uma ferramentas para isso”, afirmou.

O Cellebrite citado pela delegada é um software de segurança que faz busca de arquivos apagados nos aparelhos dos investigados e os recupera. As mensagens muitas vezes voltam com palavras embaralhadas e foram reorganizadas pela polícia, segundo ela. Outros réus também questionaram a validade dessas provas, e alguns negaram reconhecer mensagens atribuídas a eles.

A “minuta do golpe” e a reunião no Alvorada em novembro de 2022 foram também negados por dois personagens importantes: os ex-assessores de Bolsonaro Filipe Martins e Marcelo Câmara. Os episódios são cruciais nas denúncias da PGR e reforçaram a organização coordenada para execução e planejamento da trama golpista, com cadeia de comando e um beneficiário direto – o então presidente Jair Bolsonaro, derrotado por Lula ao disputar a reeleição. Martins negou que tivesse redigido ou manuseado o documento e classificou a minuta de “fantasma”.

Com os depoimentos dos réus encerrados na próxima segunda-feira, 28, os quatro processos entram em fase final. Nessa etapa, a PGR vai fazer suas argumentações finais e pedir a condenação – ou não – dos acusados, e as defesas farão suas alegações finais. Na sequência, haverá o julgamento. Bolsonaro é acusado de três crimes. A PGR pediu pena máxima para ele. A soma chega a quase 50 anos de cadeia.