Como o PlatôBR antecipou, a Polícia Federal apresentou na tarde desta quinta-feira ao Supremo Tribunal Federal (STF) o relatório final das investigações sobre a tentativa de golpe.
Jair Bolsonaro foi indiciado, assim como várias pessoas do seu entorno mais próximo, como os generais Augusto Heleno Ribeiro e Walter Braga Netto.
Os indiciamentos alcançam, ao todo, 37 pessoas. A PF aponta os crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa. Somadas, as penas máximas para esses crimes podem chegar a 28 anos.
As investigações duraram quase dois anos e foram baseadas em documentos apreendidos em diversas operações deflagradas ao longo desse período, quebras de sigilo bancário,fiscal, telemático e telefônico e informações colhidas por meio de acordos de delação premiada.
Eis a lista completa de indiciados:
- Ailton Gonçalves Moraes Barros, capitão da reserva do Exército;
- Alexandre Castilho Bitencourt da Silva, coronel do Exército;
- Alexandre Rodrigues Ramagem, deputado federal, delegado da PF e ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
- Almir Garnier Santos, almirante, ex-comandante da Marinha;
- Amauri Feres Saad, advogado, apontado como um dos autores da “minuta do golpe”;
- Anderson Gustavo Torres, delegado da PF e ex-ministro da Justiça;
- Anderson Lima de Moura, coronel do Exército;
- Angelo Martins Denicoli, major da reserva do Exército;
- Augusto Heleno Ribeiro Pereira, general da reserva do Exército e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
- Bernardo Romão Correa Netto, coronel do Exército;
- Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, engenheiro contratado pelo PL para questionar as urnas;
- Carlos Giovani Delevati Pasini, coronel do Exército;
- Cleverson Ney Magalhães, coronel do Exército que atuou no Comando de Operações Terrestres;
- Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, general do Exército, ex-comandante do Comando de Operações Terrestres do Exército;
- Fabrício Moreira de Bastos, coronel do Exército;
- Filipe Garcia Martins, ex-assessor de Jair Bolsonaro, apontado como um dos cabeças do chamado Gabinete do Ódio;
- Fernando Cerimedo, influenciador digital argentino;
- Giancarlo Gomes Rodrigues, militar do Exército, apontado como integrante da chamada “Abin paralela”;
- Guilherme Marques de Almeida, tenente-coronel do Exército, ex-comandante do Batalhão de Operações Psicológicas, ligado as forças especiais;
- Hélio Ferreira Lima, tenente-coronel do Exército;
- Jair Messias Bolsonaro, ex-presidente da República;
- José Eduardo de Oliveira e Silva, padre católico que participou de uma reunião no Planalto sobre a trama golpista
- Laercio Vergilio, coronel da reserva do Exército;
- Marcelo Bormevet, policial federal, um dos auxiliares mais próximos de Alexandre Ramagem na Abin;
- Marcelo Costa Câmara, coronel do Exército que, como assessor de Jair Bolsonaro, cuidava da coleta de informações de inteligência para o então presidente;
- Mario Fernandes, general da reserva do Exército e ex-número dois da Secretaria-Geral da Presidencia da República e apontado como autor do plano para matar Lula, Geraldo Alckmin;
- Mauro Cesar Barbosa Cid, tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro
- Nilton Diniz Rodrigues, general do Exército;
- Paulo Renato de Oliveira Figueiredo Filho, influenciador digital, neto de João Figueiredo, presidente do Brasil na ditadura;
- Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, general, ex-comandante do Exército;
- Rafael Martins de Oliveira, major, ligado ao Comando de Operações Especiais do Exército;
- Ronald Ferreira de Araujo Junior, tenente-coronel do Exército;
- Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros, major do Exército;
- Tércio Arnaud Tomaz, ex-assessor de Bolsonaro, ligado ao Gabinete do Ódio;
- Valdemar Costa Neto, presidente do PL, partido de Jair Bolsonaro;
- Walter Souza Braga Netto, general do Exército, ex-ministro da Defesa e candidato a vice de Bolsonaro em 2022;
- Wladimir Matos Soares, policial federal, também apontado como participante do plano para matar Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes.
A PF amarra várias pontas, como antecipado pelo PlatôBR. O relatório dividiu os envolvidos em grupos, cada qual com uma tarefa específica:
- Núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral: cuidou de disseminar fake news na internet para assegurar apoio ao plano
- Núcleo responsável por incitar militares a aderirem a um golpe de Estado: grupo de bolsonaristas que pressionou a cúpula militar a realizar uma intervenção e organizou acampamentos na porta de quartéis
- Núcleo jurídico: encarregado de dar uma roupagem legal à tentativa de golpe, incluindo a elaboração de um decreto para ser assinado por Bolsonaro, a chamada “minuta do golpe”
- Núcleo operacional de apoio às ações golpistas: grupo que dava sustentação ao plano usando conhecimento militar
- Núcleo de inteligência paralela: militares e outras pessoas próximas a Jair Bolsonaro que levantavam informações sobre figuras tidas como inimigas, como o ministro Alexandre de Moraes
- Núcleo operacional para cumprimento de medidas coercitivas: inclui militares que planejaram assassinar o então presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, e seu vice, Geraldo Alckmin, além do próprio Moraes.
Próximos passos
O relatório final foi apresentado ao ministro Alexandre de Moraes, que em seguida deve encaminhá-lo ao procurador-geral da República, Paulo Gonet. A partir das informações, Gonet vai decidir se apresenta uma denúncia formal ao STF contra os envolvidos.
O plano é que todos sejam julgados até o ano que vem pelo plenário do STF.
Desde o começo da investigação, em linha com o gabinete do ministro Moraes, a PF entendia que, por mais que tivesse elementos para solicitar medidas mais extremas (como, por exemplo, prisão preventiva) contra Bolsonaro e seus principais auxiliares, o melhor e mais adequado seria reunir tudo, juntar em um relatório bem amarrado, submeter à PGR e esperar que, depois de uma denúncia formal, o Supremo decida, em colegiado, sobre a culpa de cada um e estabeleça as penas.
Como o PlatôBR já havia informado, foi um cuidado para não inflamar ainda mais o ambiente político do país. Uma eventual prisão preventiva de Bolsonaro, expedida monocraticamente por Moraes, poderia gerar reações que, além de tumultuar o país, muito provavelmente atrapalhariam outras etapas da investigação. No caso de Braga Netto e Heleno, dois generais bem relacionados até hoje com a alta cúpula militar, o cálculo envolvia ainda o risco de criar atritos com a caserna.
Houve discordâncias pontuais de um ou outro integrante da equipe encarregada das apurações, mas o entendimento majoritário foi o de que seria melhor reunir tudo e aguardar por um veredicto definitivo do STF, depois de ajuizada a denúncia pela PGR.
As autoridades que trabalham no caso acreditam que, com tudo o que há na investigação e que está agora no relatório final, os indiciados, incluindo Jair Bolsonaro, muito dificilmente escaparão de uma sentença pesada no plenário do STF.
O que dizem os indiciados
No X, antigo Twitter, Jair Bolsonaro falou em “criatividade” da Polícia Federal e que vai aguardar orientação de seus advogados. "Tem que ver o que tem nesse indiciamento da PF. Vou esperar o advogado. Isso, obviamente, vai para a Procuradoria-Geral da República. É na PGR que começa a luta. Não posso esperar nada de uma equipe que usa a criatividade para me denunciar", declarou.
Braga Netto repudiou o que considera “a indevida difusão de informações relativas a inquéritos, concedidas em "primeira mão" a determinados veículos de imprensa em detrimento do devido acesso às partes diretamente envolvidas e interessadas”. A defesa ainda disse que vai aguardar ter acesso ao indiciamento para divulgar um posicionamento formal.
No Instagram, o influenciador Paulo Figueiredo ironizou Alexandre de Moraes e afirmou que o relatório é produto da “Gestapo” do ministro, referindo-se à PF. “Devo dizer que me sinto honrado. Entendo este indiciamento como parte de uma campanha de intimidação conduzida pela Gestapo de Alexandre de Moraes, que busca silenciar tanto a mim quanto o trabalho que venho realizando para conscientizar a sociedade e as autoridades americanas sobre a escalada ditatorial em curso no Brasil, que segue cada vez mais alinhado com a China", disse.
Augusto Heleno e Alexandre Ramagem disseram que não vão se manifestar. Anderson Torres e Amauri Feres afirmaram que só irão se pronunciar após terem acesso ao relatório. As defesas de Angelo Martins Denicoli e Cleverson Ney Magalhães declararam que irão se comentar o resultado das investigações apenas no curso do processo. O PlatôBR não teve obteve as manifestações dos demais indiciados – o espaço está aberto.