O secretário de Segurança do Distrito Federal, Sandro Avelar, considera que a PEC da Segurança não diminuirá a criminalidade a curto prazo. Como presidente do Consesp (Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública), Avelar pretende apresentar um pacote com dez projetos ao Congresso Nacional com medidas que considera mais eficazes e urgentes.

“A gente tem que pensar a segurança pública com medidas de longo prazo, medidas que sejam consistentes e duradouras. A segurança pública não pode ficar à mercê do governante da vez”, disse ele à coluna.

Delegado da Polícia Federal, Sandro Avelar chegou ao posto logo após os atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, quando o governador Ibanes Rocha (MDB) foi afastado do cargo e o STF decretou intervenção federal na área de segurança do Distrito Federal. Para Avelar, a Polícia Militar foi fundamental para restabelecer a ordem. Segundo ele, as imagens conhecidas de policiais deixando passar pelos bloqueios os manifestantes que invadiram os prédios do Três Poderes são exceção. Confira a entrevista a seguir.

Existe apoio de todas as secretarias de segurança do país em torno da PEC da Segurança, que tramita no Congresso Nacional?
A primeira versão apresentada pelo Ministério da Justiça causava imensa preocupação, porque não resguardava a autonomia dos estados. O Consesp se reuniu e, por unanimidade, os secretários de segurança, independentemente de serem secretários de governos de esquerda, de direita ou de centro, fizeram proposta no sentido de respeitar a autonomia dos estados, ou seja, os governadores devem permanecer com o gerenciamento das suas próprias forças policiais. Isso foi acrescentado no texto pelo ministro da Justiça (Ricardo Lewandowski), de forma que, nesse sentido, houve uma boa evolução.

Quais pontos da PEC têm o apoio das secretarias?
A criação de um fundo constitucional que garante recursos à segurança pública e ao sistema penitenciário, com a previsão expressa de que não pode haver contingenciamento desses recursos. Há também outro ponto importante, que é o compartilhamento das informações por parte dos estados e da União.

E quais pontos os senhores consideram negativos na PEC da Segurança?
Há uma preocupação quando o texto fala nas diretrizes básicas da segurança pública, que serão feitas ouvindo o Conselho Nacional de Segurança Pública. Esse conselho tem mais de 50 pessoas, entre titulares e suplentes, com perfis variados, sendo a maior parte formada por pessoas que não são da área da segurança pública. Os profissionais da segurança pública têm uma representatividade muito menor do que a desejada. Outra coisa: esse conselho fica sujeito a mudanças nas indicações de acordo com o governante da hora, por serem cargos de livre nomeação e livre demissão. Não tem consistência nenhuma, não tem estabilidade nenhuma. A segurança pública é um assunto tão importante, que a população do país reiteradamente elege como o item de maior preocupação. É preciso tratar a segurança pública com a seriedade necessária, para que as respostas sejam dadas por pessoas que tenham condições de tratar desse assunto.

Qual seria a solução para isso?
A gente tem defendido uma composição parecida com a do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público). O CNJ tem 15 componentes, sendo que nove são da magistratura, dois do Ministério Público, dois da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e mais dois indicados pela Câmara dos Deputados e pelo Senado. No CNMP, a composição é a mesma, só que com mais integrantes do Ministério Público.

Além da PEC da Segurança, que outras medidas o Consesp defende?
Elegemos os vinte principais itens de preocupação de todos os estados. Desses, selecionamos os dez mais importantes para apresentar ao Congresso Nacional como proposta de mudança na legislação. O combate ao crime organizado é um deles. Também queremos compensação financeira por parte da União àqueles estados que atuam em causas de interesse nacional. Por exemplo, os estados de fronteira que estão combatendo o tráfico, fazendo operações, muitas vezes com um estado cedendo policiais para outro estado nas regiões de fronteira, eles mesmos pagando as diárias dos policiais, sem compensação financeira por isso. Outro ponto é a composição do Conselho Nacional de Segurança Pública. Por fim, o aumento da pena para aqueles que atacam e cometem atentados contra agentes do Estado.

Esses pontos foram negociados com o governo?
Vamos realizar um evento de 1º a 3 de julho com os 27 secretários de segurança, os 27 comandantes das polícias militares dos estados, os 27 delegados-gerais das polícias civis, os 27 comandantes-gerais dos corpos de bombeiros e também representantes das polícias penais, das polícias técnicas e do Ministério da Justiça. Nesse evento, vamos debater e consolidar as propostas que tenham o apoio de todos.

Essas propostas serão encaminhadas ao Congresso Nacional?
Algumas já foram enviadas, com o aval do Consesp. Após o evento, vamos encaminhar esse pacote com as dez propostas ao Congresso.

Na opinião do senhor, a PEC da Segurança é eficaz para reduzir a criminalidade?
A PEC da Segurança não se destina a reduzir a criminalidade, sobretudo no curto prazo. Ela muda uma ou outra atribuição da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal, que são as polícias da União. Mas a sensação de segurança é feita pelas polícias estaduais: pela Polícia Civil e pela Polícia Militar, no combate aos furtos, aos roubos, aos homicídios. Ou seja, esses crimes do dia a dia que preocupam o cidadão. A PEC não se destina a atacar esses pontos, ela se destina a atacar medidas estruturantes cujo efeito possa aparecer a longo prazo. As mudanças infraconstitucionais (nas leis) têm potencial para realizar essas mudanças com maior rapidez do que as mudanças constitucionais.

O senhor tem expectativa de quando deve ser aprovada a PEC?
Não.

Na PEC, foi atendida a demanda dos prefeitos para se incluir as guardas municipais na lista dos órgãos de segurança pública previstos na Constituição Federal. Qual a opinião do senhor sobre essa medida?
É uma medida controvertida. Há quem apoie e há quem não apoie. É preciso que haja uma certa cautela para não haver sobreposição de atribuições entre as guardas municipais e a Polícia Militar. Alguns estados apoiam, mas não são todos. Vai competir ao Congresso Nacional discutir e deliberar sobre a conveniência das guardas municipais. Algumas regras vão precisar ser criadas, como o uso de armas pelas guardas municipais.

Qual avaliação o senhor faz das políticas de seguranças públicas do país?
A gente tem que pensar a segurança pública com medidas de longo prazo, medidas que sejam consistentes e duradouras. A segurança pública não pode ficar à mercê do governante da vez. Lá no Consesp, temos conseguido decisões unânimes. Os secretários de segurança, independentemente de serem de governos esquerda ou direita, todos têm essa preocupação de alinhar tecnicamente medidas profícuas, para produzir bons resultados.

Falta pensar a segurança pública a longo prazo no atual governo federal?
O que a gente está fazendo é justamente se oferecer para ajudar o governo federal a pensar essas medidas de longo prazo.

Sobre o 8 de Janeiro, quando a PM chegou para cumprir a ordem judicial de prender os acampados do quartel-general e as Forças Armadas impediram que isso acontecesse, houve interferência indevida de uma corporação sobre a outra?
Eu não posso dizer, não estava no local. O que posso dizer é que coube à Polícia Militar o papel de ingressar em diversos órgãos que tinham sido invadidos. A PM, embora tenha ficado muito exposta naquela ocasião, foi a instituição que restabeleceu a ordem em todos os órgãos, tendo esses órgãos algum tipo de policiamento específico ou não. Com relação aos fatos que aconteceram no 8 de Janeiro, sobre esses contatos que teriam sido feitos entre a PM e o Exército, eu não tenho como falar, porque não conheço esses fatos.

O senhor disse que coube à PM o papel de restituir a ordem após a tentativa de golpe. Mas, ao mesmo tempo, foram divulgadas muitas imagens de policiais que deixaram de atuar para conter os invasores na Praça dos Três Poderes. Houve uma duplicidade de papéis na atuação da PM naquele dia?
Eu acho que isso não pode ser atribuído à instituição. Quando a gente fala Polícia Militar, a gente está falando da instituição, que é a grande maioria das pessoas que trabalham e fazem aquilo que tem que ser feito. Se tem o CPF de algum policial militar que tenha deixado de fazer o que tinha que ser feito, isso tem que ser apurado. Para isso, existem corregedoria, processos disciplinares e processos criminais, que alguns estão respondendo. Não estamos falando da PM, estamos falando de pessoas que não agiram como deveriam.

Ainda tramitam processos disciplinares contra esses policiais na PM?
A partir do momento que a questão foi judicializada, os procedimentos administrativos serviram para instruir os autos do processo.

Não houve punição disciplinar a esses policiais que não agiram como deveriam?
Não. Os procedimentos foram encaminhados e agora estão no âmbito judicial. Estamos aguardando as definições do Poder Judiciário.

Depois do 8 de Janeiro, a segurança na Praça dos Três Poderes foi reforçada. Há preocupação com eventuais ataques durante os depoimentos e no julgamento dos réus por tentativa de golpe?
A PM está acostumadíssima a atuar na região. Na quarta-feira (refere ao último dia 21) mesmo, um evento para mais de 20 mil pessoas a respeito da diversidade, coube à PM fazer a segurança no local. A PM tem feito a segurança no Supremo e também acima do Congresso Nacional, quando tem alguma manifestação na Esplanada.

Mas, independentemente de eventos ou manifestações, houve reforço da PM na segurança na área?
Houve aumento do efetivo da PM através dos concursos promovidos ainda no governo Ibaneis Rocha. Com isso, houve possibilidade maior de aumentar o efetivo de alguns batalhões – como, por exemplo, o 6º Batalhão, que é o responsável pela segurança na Praça dos Três Poderes e na Esplanada. Colocamos, no início do ano passado, mais 500 policiais nesse batalhão. Foi um reforço bastante significativo.