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Sem choque fiscal, taxa de juros perde eficácia no controle da economia

Alerta do Banco Central nas discussões sobre a atual conjuntura deu a real para Lula comprar a necessidade de se fazer o ajuste fiscal

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

“Não basta ter senso de urgência, é preciso demonstrar que o governo realmente tem esse senso de urgência.”. Essa narrativa do presidente Lula e da sua equipe econômica deu a largada na estratégia oficial para tentar administrar a volatilidade do mercado financeiro, ganhar tempo enquanto lida com seus próprios temores e retomar as rédeas no gerenciamento das expectativas. Ela foi resultado de um cenário desenhado pelo Banco Central que não deixou dúvidas: sem um choque fiscal, agora, o Brasil pode caminhar para um descontrole tamanho em que “a política monetária perderia sua eficácia contra uma espiral especulativa”. E isso estouraria em 2026, ano da escolha do sucessor de Lula.

Nas últimas conversas com Gabriel Galípolo, diretor de política monetária que assumirá a presidência do BC em janeiro do ano que vem, e o ministro Fernando Haddad (Fazenda) sobre a conjuntura econômica, o presidente Lula foi alertado para a encruzilhada política na qual a economia o colocará num momento estratégico, se nenhuma atitude for tomada logo. Com o ritmo de crescimento das despesas, o espaço para fazer política, garantindo investimentos em 2026, estaria comprimido como nunca aconteceu na história econômica recente. E altas de juros poderiam não surtir efeito diante de uma crise de confiança no governo, puxando especulação financeira.

Grau de investimento
Esse cenário é exatamente o oposto do que estava nas contas do presidente, que sonha chegar em 2026, último ano de seu atual governo, com a retomada do selo de investimento distribuído pelas agências internacionais de risco, inflação sob controle e economia crescendo, gerando emprego e renda.

A piora no humor dos investidores financeiros internacionais nas últimas semanas acentuou o quadro negativo pintado por Haddad e Galípolo e que, acreditava-se, estaria mais bem delineado no início de 2025. Assim, com atraso de quase um ano, as discussões sobre o ajuste nas contas públicas ganharam prioridade na agenda do presidente.

Há mais de seis meses, Lula já tinha um esboço de medidas necessárias para controlar despesas e a escalada da dívida pública. Desde 2023, as equipes da ministra Simone Tebet (Planejamento) e de Haddad trabalham em alternativas para resolver o problema do gasto público, considerado estrutural. No entanto, isso sempre esbarrou na falta de vontade política de Lula de mexer em temas absolutamente impopulares, como fim de desonerações de vários setores, desvinculação das despesas com saúde e educação do crescimento das receitas oficiais e revisão de programas sociais. Tebet e os técnicos perderam espaço interno, Haddad focou, inicialmente, apenas no aumento de receitas e o tema ficou em segundo plano.

'Não dá mais'
“Agora, não dá mais”, diz um interlocutor oficial. “Não há essa coisa de ‘na minha área ninguém mexe’”, complementa, dando o tom predominante nas reuniões das últimas semanas no Palácio do Planalto. Na última segunda-feira (04), o presidente Lula, os ministros da Casa Civil, da Fazenda e do Planejamento, se reuniram com os ministros da Saúde, Educação, Trabalho e da Gestão e Inovação. Ontem, foi a vez dos ministros do Desenvolvimento Social e da Previdência discutirem o tema com a Casa Civil.

“Esse tema (ajuste fiscal) está amadurecendo”, argumenta um técnico do governo. Lula, inclusive, teria cobrado de Haddad que expressasse essa urgência como uma decisão de governo. Daí a ação coordenada para anunciar o cancelamento de viagem internacional de Haddad, que ficou no Brasil tratando do assunto com o presidente. Dias antes, o próprio Haddad havia declarado que o governo não tinha data prevista para fazer um anúncio de medidas na área fiscal. O ministro teve que voltar atrás. Pouco tempo depois, sinalizou que as medidas podem ser oficialmente divulgadas nesta semana. No entanto, técnicos do governo afirmam que o presidente ainda não bateu o martelo sobre quais medidas entram, ou não, no pacote desenhado até agora.

Há avaliações internas segundo as quais a urgência em função da volatilidade no mercado financeiro ajuda na compreensão dos ministros e, também, nas negociações políticas. Com a tese de que todos terão que contribuir, o governo retomou conversas que já fizeram o próprio Lula torcer o nariz. Entre elas estão: i) um novo parâmetro para os gastos obrigatórios com saúde e educação e criação de mecanismos de gatilhos que podem ser acionados para ajudar na estabilidade das despesas e da dívida pública; ii) mudanças no cálculo do seguro-desemprego; e iii) novas regras para abono salarial, BCP (benefício concedido a idosos e portadores de deficiência) e auxílio doença.

O presidente foi aconselhado no sentido de que o momento atual garantirá a ele melhores condições de negociação política para aprovação do que se deixar para mais adiante. A expectativa do mercado é que até a próxima sexta-feira a equipe econômica faça, finalmente, o anúncio das medidas.

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