O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), ganhou fama no Congresso de não gostar de embates. Nesta semana, depois da traumática ocupação da mesa diretora na abertura do semestre, ele demonstrou a intenção de suspender por seis meses os mandatos dos deputados da oposição responsáveis pelo ato. Mas, em vez de adotar o rito sumário, ele optou por terceirizar a responsabilidade para a corregedoria da Casa, hoje nas mãos do deputado Diego Coronel (PSD-BA).
A decisão de Motta recebeu críticas de todos os lados. Os bolsonaristas reclamaram do envio da lista de acusados de impedir a reabertura dos trabalhos e chamaram Motta de “injusto”. Alguns atacaram o que seria uma falta de critério para a escolha dos denunciados. “Eu não me sinto confortável em ver vossa excelência citar que há a possibilidade de suspender 14 deputados. Confesso que eu gostaria que meu nome, porque eu participei, estivesse na relação dos 14”, disse o deputado Alberto Fraga (PL-DF), se dirigindo a Motta no plenário da Câmara. O presidente da Câmara ouviu, não comentou, e seguiu a sessão sem responder ao parlamentar.
Lideranças governistas indicam que, ao optar pelo rito da corregedoria, Motta decidiu postergar, ou mesmo não punir, os responsáveis pela ocupação . “A prática dos bolsonaristas é a chantagem , eles vão continuar. Essa obstrução regimental eles têm direito, mas é uma prática que revela o método”, disse o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), referindo-se ao anúncio de obstrução feito pelo líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), após a reunião de líderes, nesta terça.
Na parte da manhã, Motta conseguiu conter as reclamações na reunião de líderes. Quando os representantes do PT e do PL tentaram falar sobre o tema, ele informou o rito escolhido e encerrou o assunto indicando que o caso era da competência do corregedor e não deveria contaminar a reunião do colegiado.
Grupo de trabalho
Motta também recebe críticas por muitas vezes optar pela criação de grupos para analisar propostas em tramitação, encaminhamento que tradicionalmente cumpre a função de esfriar as discussões mais acaloradas. No fim de semana, com a viralização de um vídeo do influenciador Felca denunciando a adultização de crianças e adolescentes nas redes, ele indicou que pautaria a discussão no plenário. Só que, mais uma vez, o presidente da cama escolheu uma solução demorada: a criação de um grupo para discutir mais de 60 projetos protocolados na Câmara sobre o assunto. A decisão, curiosamente, foi anunciada por ele como uma solução urgente para um problema grave.
“Eu sou pai. Pai de duas crianças. E, ao ver aquelas imagens, a minha primeira reação não foi política, foi humana. Foi a de um pai que se pergunta: que mundo estamos entregando para os nossos filhos?”, disse em discurso no Plenário. “Existem matérias que são mais do que urgentes: elas são inadiáveis, incontornáveis. Elas são obrigações morais de qualquer civilização que se pretenda digna desse nome. Proteger a infância não é um favor, é um dever. É um dever que antecede partidos, ideologias e disputas”, disse Motta.
O detalhe é que havia a previsão de votação nesta terça da urgência de um projeto sobre a proteção das crianças nas redes sociais, de autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), já aprovado no Senado. Motta, porém, decidiu não trazê-lo para a pauta. Agradou, assim, à oposição, que se coloca contrária à proposta com o argumento de que fere o princípio da liberdade de expressão.