As universidades dos Estados Unidos sempre foram celebradas por defensores da privatização do ensino superior como exemplos de excelência acadêmica e autonomia frente ao poder público. Na esteira da rota de colisão das instituições nos EUA e o governo Donald Trump, no entanto, esses entusiastas têm visto suas percepções em xeque nas últimas semanas.
No último dia 14, Trump anunciou o congelamento de US$ 2,3 bilhões em subsídios e contratos federais da Universidade Harvard, uma das mais prestigiosas do mundo (à esquerda na imagem acima), depois de pressionar a instituição a implementar mudanças administrativas e nas políticas de admissão. Diante da tentativa de interferência, a universidade, com razão, reagiu e anunciou um processo contra o governo americano — mas o montante vultoso bloqueado pela Casa Branca deixou evidente o peso financeiro do governo no ensino superior privado.
Em 18 de abril, uma reportagem do The New York Times expôs a dependência das universidades americanas em relação aos cofres públicos.
O jornal mostrou como, por décadas, na lógica predominante nos Estados Unidos de ser o país pioneiro em descobertas, pesquisas e inovação, o governo americano ofereceu bilhões de dólares a universidades, usados para construir laboratórios, infraestrutura e atrair professores e estudantes de alto nível de todas as partes do mundo.
Ainda conforme o The New York Times, as universidades americanas gastaram US$ 60 bilhões em verbas federais para pesquisa e desenvolvimento somente em 2023, no governo do ex-presidente democrata Joe Biden. O montante é trinta vezes maior que o investido na década de 1950, no início da evolução do sistema universitário dos Estados Unidos.
Com a volta de Trump, as universidades passaram a se ver na mira da Casa Branca porque o presidente insiste em evocar fantasmas de um ativismo que, na opinião dele e de republicanos que o apoiam, desvia o foco das universidades.
No Brasil, em se tratando financiamento federal, a situação das universidades públicas continua crítica. A repórter Anna Bustamante mostrou no último 18 de abril a penúria da UFRJ. A instituição de ensino tem dívidas de R$ 61 milhões e uma inspeção recente apontou a necessidade de reformas em 75% dos 154 prédios da universidade.
À coluna, o reitor da UFRJ, Roberto Medronho (foto abaixo), apontou haver um “subfinanciamento crônico que se agravou nos últimos anos”. “O nosso orçamento que será aprovado no Conselho Universitário já prevê um déficit de mais de R$ 100 milhões”, afirmou Medronho.
Apesar das gritantes dificuldades financeiras, o reitor diz ser “radicalmente contra” a privatização do ensino superior. “O ensino superior público no Brasil é de alto nível. Nós precisamos que o Estado assuma a educação superior, a ciência, a tecnologia e a inovação”, avaliou.
Para Medronho, o Executivo deve investir nas universidades, mas não deve haver uma relação de dependência das instituições com governos de ocasião, e sim autonomia financeira. Ele citou como exemplo as universidades estaduais paulistas, como USP e Unicamp, que têm orçamento e autonomia para investir. “Há necessidade de estabelecermos parcerias público-privadas, republicanas, com o setor produtivo e que envolvam o desenvolvimento nacional do país”, concluiu.